PUBLICAÇÕES NA REVISTA SOCIOLOGIA

Dois artigos meus foram publicados na revista Sociologia Ciência e Vida da editora Escala. Um sobre quadrinhos e desenhos animados japoneses e sua influência no Brasil e outro sobre pesquisa eleitoral. Abaixo estão os links para baixar gratuitamente a versão digital ou para comprar as edições impressas.

Este artigo foi fruto de minha monografia de conclusão do curso em Ciências Sociais. Para baixar o texto da monografia entre no site Guia dos Quadrinhos: Guia dos Quadrinhos


HERMÉTICO



Eu caminho solitário no nada absoluto.

No princípio de tudo.

Na casa das idéias. Milhões a cada segundo. Inclusive a contagem de unidades e de tempo.

Penso criativamente em milhares de línguas a um só tempo. Inclusive o português limitado desse escritor tão distante ainda do arqué e desse suposto ponto do tempo. Na verdade em mim não há essas divisões. O escriba escreve com a sombra de minha idéia de caneta, digo isso a Platão em algum ponto da idéia de história. E mais tarde concebe o “passar a limpo”, nuances de linguagem, em seu laptop LG dentre tantas outras marcas que crio.

O autor para e pensa no que escreve, o que eu já de antemão previra. Sabia que escreveria esse texto em post it, uma das grandes sacadas que tive. Tudo pensado milimetricamente. Até fios de cabelo, como a bem empregada imagem poética do evangelho de Lucas. Aliás, autores são partes de mim que gosto muitíssimo. São minhas porções criativas. Predestinados com o gene da criação e da criatividade.

Do meu êxtase ao conceber o mundo...

Nesse ponto o autor reflete se predestinado a um destino escrito num romance que não dele ou predestinado a livres escolhas ou a sinopses pré-escritas de circunstâncias que o fazem escolher de forma não tão livre assim.

Mas segue escrevendo seguindo a inspiração da tal musa. Outra divina invenção? Ou sinapses elétricas? Ou retalhos de leituras e experiências que num caldeirão existencial o trouxeram até aqui?

OBRIGADO, COLÉGIO PERBOYRE E SILVA


Muitas pessoas têm os chamados sonhos recorrentes. Aqueles, que, vez por outra Morfeu, o deus grego do sono e dos sonhos repete em nossas noites. Reprises recorrentes de fragmentos do inconsciente, diria Freud. Meu único sonho recorrente, pelo menos aquele que resvala em meu consciente, presente de Mr. Sandman, é com a escola onde passei alguns anos de minha vida, o Colégio Cenecista Perboyre e Silva. Comum por muitos anos, esta reprise onírica esteve em cartaz em muitas de minhas narrativas noturnas e quiçá, diurnas também. Mesmo já na universidade era comum eu sonhar com episódios envolvendo salas de aula, colegas e professores da faculdade, como se vividos nas dependências daquela escola. Compreensível, visto eu ter passado 15 de meus anos lá. Dez como aluno e cinco como professor.

E nesses 50 anos que a escola está completando só posso agradecer por todos os frutos maravilhosos que lá colhi. Estudei com alguns colegas que foram e ainda são meus melhores amigos, como o Clodoaldo. Muito do que sou hoje são faces e facetas de minha história naqueles corredores e salas. Em estudos, conversas paralelas, fugas cinematográficas para se livrar das aulas, namoricos, discussões, brigas, elucubrações e descobertas. Foi onde descobri que não levava jeito para os esportes, mas foi também onde descobri que podia ser escritor. Aliás, foi lá que duas professoras acreditaram antes de mim mesmo que eu podia escrever. A Profa. Áurea e também a Profa. Maria Helena Russo, de quem, anos depois, eu tive a honra de ser colega.

Dois de meus melhores e queridos amigos, com quem muito aprontei nos anos de aluno se tornaram também colegas de trabalho no meu tempo de professor. Deassis e Freitas. E nesse período de professor três colegas se tornaram amigos. Allan, Paula e Ana Paula.

Vários alunos também se tornaram amigos, três deles bem próximos. Acélio, Amaury e Kellson. E juntos com Ritiélly e Vanessa, também alunas, criamos um grupo literário hoje conhecido e reconhecido na cena underground de várias partes do país, os Luminários. E folgo em dizer que todos os cinco estão hoje na faculdade, o que me deixa bastante orgulhoso deles.

Até relacionamentos amorosos tive lá.

O “colégio”, modo que nos referimos a esta querida escola, talvez por acharmos que ela seja de fato “o” colégio de Redenção, por não termos dúvida de que seja realmente o melhor, me deu, quando ainda aluno, amigos verdadeiros, aprendizagens eternas e a convicção de uma carreira através da escrita. Quando professor me deu mais amigos e também subsídios profissionais e intelectuais que emprego na política profissional do Instituto Maria Ester e da Fundação Maria Ester, as quais, entre outras áreas, atuam na assessoria educacional.

Hoje estou como admirador e agradeço por todos os encontros e desencontros que lá protagonizei e pelos episódios e cenas dos quais fui platéia. Hoje só parabenizo por suas bodas de ouro. Hoje só me delicio nas memórias de meu hipocampo. Hoje só me reencontro existencialmente nos vários colegas com quem ali contracenei como a Rosângela, o Seu Neném e a Rita. Hoje só pontuo tudo que ensinei e tudo que aprendi com meus alunos, como o Glawber, o Ézio e a Monyk (que também estão na faculdade) e tantos outros que me marcaram. Hoje declaro meu orgulho cenecista (desculpem-me as outras escolas onde já estudei, dei aulas ou oficinas). Hoje só tiro o chapéu e digo obrigado, colégio Perboyre e Silva.

Na ocasião da festa do reecontro os ex-professores foram homenageados com um cordel de autoria do poeta Ari. A estrofe que faz referência a mim, transcrevi abaixo:

Marcelo, grande amigo,
Na Literatura e Redação
Ensinava com muita garra
De acordo com a precisão,
Pois era bamba nos assuntos
Que juntando todos juntos
Causava admiração

CURRÍCULO GEEK


Já ouvi disco em LP e Compacto. Lembro-me inclusive de um disco do Balão Mágico – é, sou desse tempo, e assisti também ao Xou da Xuxa e à TV Colosso – que eu ganhei de uma prima mais velha e risquei com uma faca alguns anos depois, pois já me achava muito crescido para ter um disco como aquele. Comprei fitas K7 originais, mas gravei muitas a partir de LPs emprestados. Era o início da pirataria fonográfica. Tive Walkman de fita K7 e Discman (tragédia portátil para CD). Vi o nascimento e o declínio do cd. Passei pelo Napster e hoje, mesmo CDs que compro passo para Mp3 (não há melhor que o Ipod). Os cartões de memória e pendrives (flashdrives) são mais fáceis de transportar que pilhas de CDs, sobretudo no carro.

Já revelei filmes fotográficos em salas escuras, tive câmeras amadoras analógicas, fiz cadeira de fotografia analógica na faculdade com câmera profissional, aprendendo a usar rolos, revelá-los e ampliá-los. E ao perguntar ao meu professor se deveria comprar uma câmera dessas pra mim ele me respondeu dizendo que só se eu estivesse louco. Aquela seria a última cadeira de fotografia que a universidade oferecia sem ser digital. Hoje só uso câmera digital. Tenho uma amadora e uma semiprofissional e namoro uma profissional que fica na vitrine de uma loja do shopping Iguatemi. Câmeras de vídeo usei várias daquelas que gravam direto no VHS seja no formato convencional ou pequeno. Hoje, claro, só uso filmadoras digitais. Contudo, ainda não tive o prazer de usar uma profissional.

Comecei a escrever meus textos numa máquina de escrever portátil que ainda guardo, dada por meu irmão mais velho. Hoje posto diretamente no blog na internet. E administro diversas contas de sites e redes sociais de clientes do meu escritório. Tive vários computadores, sendo que o primeiro deles tinha um HD com capacidade de espaço nove vezes menor que um de meus pendrives atuais. Hoje uso um notebook, um netbook (tudo, na verdade, é laptop) e um desktop e ando pesquisando smartfones. Aliás, o meu primeiro celular mais parecia um peso de papel. Hoje tira fotos, tem tocador de Mp3, rádio e gravador de voz. Quando estava na faculdade ainda usei gravador de voz para pesquisas, daqueles de mini K7. Ainda o guardo comigo e os mini K7 com as entrevistas. Já usei celulares de várias marcas e de várias operadoras.

Já li centenas de livros. Em formato convencional e físico, claro. Ainda os adoro. Nunca gostei de ler e-book no computador. Ouvi dezenas de Audiobooks e agora, com meu leitor digital, pretendo aderir aos e-books. Em breve comprarei um tablet também, para ler livros e revistas em cores, sobretudo quadrinhos, outra de minhas paixões. Já comprei livros por telefone, em diversas livrarias, hoje a maior parte das minhas compras é feita pela internet, sobretudo na Saraiva e no Submarino. Já participei até de clubes de livros e de CDs por correspondência.

Sou cinéfilo. Assisti a milhares de filmes. Minha primeira ida ao cinema foi com minha irmã e minha mãe. Era bem pequeno, fomos ver um filme dos Trapalhões. Não me concentrei muito, fiquei brincando de trocar de lugar na sala quase vazia. Não foi um momento especial em minha memória. Mas hoje acho o cinema um lugar mágico. Assisti a muitos VHS, tendo de rebobinar sempre as fitas, tenho centenas de DVDs e recentemente aderi também ao Bluray (que talvez já tenha nascido obsoleto). Mas baixo da internet muitos filmes antigos que não são encontrados à venda nem para aluguel em locadoras, em formato Avi ou RMVB.

Já usei internet discada (e lenta a 56 Kbps), participei de salas de bate papo, hoje uso o MSN, com minha Banda Larga GVT ou no modem 3G da vivo. Usei até o Cadê?, mas me rendi a todos os serviços do Google. Uso Twitter, Orkut, Facebook, Formspringme, O Livreiro e outros mais.

Tive TV em minha casa quando criança tanto preto e branco como em cores. Usei tubo de tela curva, de tela plana. Hoje tenho LCD Full HD.

Videogames já usei vários consoles e joguei dezenas de games. Desde os primeiros, como Atari e Odissey, passando por Super Nintendo e Mega Drive e agora Wii, Xbox 360 e Playstation 3. Joguei games portáteis e de celular. E também joguei vários jogos de tabuleiro com amigos, que adoro. War, Banco Imobiliário, Jogo da Vida, Detetive e muitos outros. Joguei até bola de gude, peão e soltei pipa. Jogo bem boliche e tênis de mesa, mas nas duas modalidades no Wii Sports Resort sou melhor ainda. Já brinquei até com tamagotchi.

Já enviei e ainda o faço, muitas cartas de amor, mas também já usei muito SMS e MMS, sou craque no teclado alfanumérico e também no QWERTY.

Tenho visto o declínio de tecnologias antigas e o surgimento de outras. Desejo assistir a esse ciclo ainda muitas e muitas vezes.

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PRISÃO PARTICULAR


Tenho cinquenta e poucos anos. Não falo dos poucos porque há muito os perdi conscientemente de minha contagem. Não faço mais anos, me escondo da inexorabilidade da velhice que me chama a cada instante. Ela não me seduz, mas com ela me casarei num amor fadado ao fim. Queria ter morrido na adolescência. Feliz e realizado. Morrido em um acidente de carro ao participar de pegas ou de overdose, tentando tirar a essência da vida, tentando descobrir quem era. Abstive-me sempre dos prazeres pequenos, de mentir, de dançar, de transar loucamente com pessoas sem nome. De perder a consciência e o juízo para o álcool. De viajar levando apenas uma mochila com coragem e curiosidade. Desde pequeno acho que nasci no corpo errado. Vejo-me no espelho e não me reconheço. Aquele não sou eu. Vejo-me diferente. E esse corpo, esse rosto, representam quem não sou e contam mentiras sobre mim para quem se aproxima. Represento um papel através dele. Queria ter sido camaleão, mutável, corpo de amante latino, suor e sedução, mas me contive covardemente com o não-eu imposto por meu físico. Não vivi o que gostaria com medo de me transformar, de sair do comum biótipo a que estive condenado a existir. De páginas amareladas de psicologias superadas numa biblioteca empoeirada aprendi que sou ectomorfo. Minha vontade era ser mesomorfo, quem sabe meu comportamento seria outro, condizente com o que sempre quis ser. Nasci no corpo errado, e para mim – fugindo do que Platão quis dizer e muitíssimo distante do que disse Paulo, o apóstolo –, ele me foi, por toda a vida, realmente um cárcere.

A REDE


Ele era um jovem e tradicional vaqueiro do interior do Ceará. Gostava de andar a cavalo para observar e se orgulhar do seu pequeno rebanho, que herdara do pai, que também lhe ensinara toda a arte de cuidar de gado. Dava-lhe prazer tratar o gado como pessoas, e a vacaria, e toda a pequena fazenda, como uma empresa, da qual ele entendia que administrava com esmero. Aquele era seu mundo, ali nasceu, aprendeu com o pai a ser vaqueiro, tinha o sotaque dali e casara-se com uma das primas, que nem era tão atraente para ele, mas era da família e era aquela a tradição que aprendera. Nunca havia viajado e só conhecia o mundo pelo segundo grau mal feito e pela pequena TV preto e branco, onde via o noticiário, comparando sempre as confusões do mundo com o comportamento de suas vacas, para ele sempre felizes e sem preocupações.

Certa manhã, quando caminhava pela pastagem observando o gado e as serras em redor, o que fazia sempre quando o sol começava a dar os primeiros bons dias, notou que seu rebanho estava irrequieto, parecia que algo havia-lhe assustado. Procurou em redor mas não viu nada que pudesse causar medo, nenhum animal estranho à fazenda. Sem entender o que se passava com as vacas, aproximava-se delas, tocava-lhes com carinho, mas muitas pareciam assustadas e outras até mesmo deprimidas. Não entendendo mesmo o que havia acontecido, resolveu esquecer, pois já era hora dos peões da fazenda levarem as vacas leiteiras para a ordenha.

O tempo passou e o problema daquela manhã continuou a se repetir e as vacas começaram a emagrecer e a morrer. Com medo de perder todo o seu gado, resolveu investir em um curso de veterinária na capital, como dizia. O curso era dado por veterinários experientes o que lhe fez acreditar que seria de grande proveito para ele. Chegando à capital, logo se vislumbrou com tantas coisas novas que se refletiam em seus olhos. Começou o curso com empenho e dedicação e rapidamente fez amigos, com quem sempre saia para conhecer o mundo que não existia entre suas vacas. Para ele tudo era novidade, agora ele experimentava o mundo do qual tivera sonhos secretos antes de dormir. Nos estudos era exemplar e ficava imaginando como seu pai e ele mesmo, puderam cuidar do gado por tanto tempo sem conhecer todas aquelas técnicas que estava aprendendo. Acreditava que agora iria quadruplicar o seu rebanho e aumentar sua fazenda, e poderia, finalmente, fazer uma reforma no velho casarão. Sonhava à noite antes de dormir, com sua fazenda próspera, seu gado mais gordo, mais feliz. Sua esposa poderia ficar mais atraente com as jóias e vestidos que lhe compraria. Seus filhos iriam estudar na cidade grande, para ver como o mundo é imenso e não se restringe só a terras e gado.

O curso acabou e o vaqueiro voltou para o interior cheio de projetos para pôr em prática tudo que aprendera. Logo que chegou à fazenda fez um grande churrasco para a família e os empregados, para comemorar sua volta. Disse que a partir daquele dia todos iriam ver aquela pequena fazenda se transformar numa imensidão de terras e gado. No outro dia cuidou de suas vacas, empregou técnicas que aprendera no curso e almoçou com satisfação. À tardinha escreveu todo um projeto para a maximização de seu rebanho. Previu tempo de engorda, abate, venda e novas aquisições. No dia seguinte ordenhou as vacas leiteiras, ensinou aos empregados a nova dieta para o gado e caminhou como costumava, na pastagem. À tarde tirou uma longa soneca na rede que sempre deixava na varanda.


Passaram-se dias, semanas, meses e todos notavam a melhoria na fazenda. O vaqueiro comprou terras vizinhas, reformou o casarão e o gado estava sendo considerado o melhor da região. As vacas já não pareciam mais assustadas e deprimidas, ele próprio notara a felicidade das vacas quando caminhava entre elas pela manhã. Mas aquilo dava-lhe muito trabalho, não era fácil seguir um novo modelo de criação de gado como imaginara em seus sonhos na capital. Os modos de tratar do gado que herdara do pai lhe pareciam novamente bons, não lhe dava tanto trabalho, não precisava dar tudo de si, como agora fazia. Além do mais, o entusiasmo adquirido no tempo dos estudos, os projetos, as imagens todas, estavam aos poucos desaparecendo de suas lembranças. Para ele nada mais gostoso do que à tarde, depois do almoço deitar-se e dormir tranqüilamente na rede da varanda. A fazenda ficou sem força motivadora e aos poucos voltava a rotina de antes. O vaqueiro já não falava para os filhos do mundo que existia lá fora. Também já não falava entre os peões da fazenda de suas aventuras na capital. A fazenda voltou a ser a fazendinha do seu Minino. E seu Minino ficava se perguntando quando caminhava na pastagem sob o sol que ainda nascia, com grande contentamento em ter aquele pequeno rebanho e cuidar de gente que não conhecia o mundo que conhecera na cidade grande, por que já não sonhava mais à noite...

FORTALEZA NOS QUADRINHOS


Fortaleza foi, recentemente, cenário para uma história em quadrinhos de um dos mais famosos personagens dos gibis americanos, Wolverine, dos cultuados X-men. A história foi publicada no final de 2006 na Europa e EUA e em fevereiro deste ano traduzida no Brasil. Nas lojas especializadas em quadrinhos de Fortaleza, no entanto, só pôde ser facilmente encontrada há pouco tempo. Os autores são franceses. Jean-David Morvan e Philippe Buchet, que, curiosamente, nunca estiveram em nossa cidade.

A trama gira em torno de uma criança fortalezense com poderes especiais e que mora no Pirambu. Sua mãe, ele conta, o teve em um lixão, morrendo ali, sendo levada por um caminhão de lixo. Ele sobreviveu e foi mandado para um orfanato. Wolverine o conheceu quando o menino, de nome Xexéu, roubou sua moto logo quando desembarcou no porto. Ele se solidariza com o menino e o acompanha, depois de salvá-lo de uma gangue que tomou a moto que havia roubado. Depois se diverte tomando banho de mar e dormindo no barraco do garoto. Diz que foi melhor que ir para um hotel para turistas na Praia de Iracema.

Aliás, a cidade representada não é para turista ver. Tudo bem, temos nossos problemas, mas os cenários são totalmente inverossímeis, os autores não fizeram sequer pesquisa. Fortaleza é só mato, ruas de terra, barracos e homens armados, com carros e ônibus saídos da década de 70, quebrados e sujos.

No clímax da história o menino a quem Wolverine se apega é obrigado a trabalhos forçados na Serra Pelada. Anacrônico e sem noção de geografia. Mesmo com tudo isso, Wolverine, no final da história, já nos EUA, relembra dos tempos em que esteve na Terra do Sol e usa a palavra aprendida por aqui para expressar o que está sentindo. Saudade. Aliás a palavra da título a HQ.

Sei que é uma obra de ficção, mas porque o encantamento estrangeiro com nossa faceta pobre? Estranhamento ou ignorância?

A INDUSTRIALIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA

Adorno e Horkheimer, da Escola de Frankfurt, interpretaram como ninguém o espírito consumista do século XX. Para eles o Capitalismo transforma arte em mercadoria, diminuindo assim o seu valor.

Entramos no século XXI seguindo a mesma lógica, isto é, qualquer coisa pode ser transformada em dinheiro. Dessa vez industrializamos e transformamos a violência, fenômeno que vem crescendo de forma significativa nas grandes cidades. Os americanos, claro, já vem representando a violência deles no cinema, tão conhecido nosso. Por aqui, em terras tupiniquins, estamos aprendendo. Com livros como “Cidade de Deus” do escritor e sociólogo Paulo Lins e “Estação Carandiru” do médico Dráuzio Varella, best-sellers que também viraram filmes de grande sucesso. Não quero, obviamente, questionar sua qualidade e importância. Mais recentemente apareceram “Abusado” e “Rota 66” do jornalista Caco Barcellos e a mini-série “Cidade dos Homens” e o documentário “Falcão” do Fantástico, ambos da Rede Globo (este foi proibido). Isso para citar só os mais conhecidos.

Tudo bem, levamos a favela à classe média, aos lares e mesas de jantar; tornamos pública a violência urbana, mas e daí? Compramos a violência, nos divertimos com ela e nos esquecemos de que ela não é uma mercadoria, mas uma realidade que precisa ser combatida. Não se distraia muito com esses produtos, alguém pode assaltá-lo.

A ESQUERDA E O PODER EXECUTIVO

Demoramos, mas vamos admitir de uma vez por todas, a esquerda brasileira só tem competência no legislativo.

Ao longo dos anos a esquerda do Brasil conquistou seu espaço fazendo as leis. Avançou em questões ligadas aos direitos humanos, provou competência política, arregimentou de estudantes a intelectuais. De movimentos homossexuais a movimentos ecológicos. Acreditamos numa esquerda inteligente, capaz, que finalmente levaria o Brasil ao tão sonhado país do futuro, o medo se transformou em esperança.

Com algumas exceções que confirmam a regra, já tínhamos visto a inaptidão da esquerda para o poder executivo através dos vários prefeitos eleitos pelo país, mas ainda tínhamos fé no operário. E por que não? Na época o acadêmico não nos parecia tão bom. Mas, ao que parece, ao chegarem lá nos mandos executivos, ainda não acreditando na vitória, lembraram do poeta: "E agora José?".

No executivo, a ideologia socialista não funciona. O que vemos é um ranço da ditadura estabelecida em todos os lugares onde o marxismo-leninismo deus as cartas, através de tentativas de controlar a imprensa e as universidades. Da imposição de juros cada vez mais altos, de uma carga tributaria que envergonharia até mesmo os coletores de impostos da Idade Média. De uma enxurrada de medidas provisórias. Da compra a altos valores de votos para a aprovação de projetos que lhes são convenientes e para que se encerrem CPIs constrangedoras e perigosas. Enquanto isso, o espetáculo dos comerciais caríssimos entretém o povo, que, afinal, adora televisão e acredita em tudo que ela transmite.

E assim vamos nós, cobaias para a derradeira tentativa de mostrar que a esquerda funciona, afinal, o Muro de Berlim já não existe, a China se rendeu ao capital e Cuba é uma ilha fracassada a espera da morte de seu chefe.

Por todos os lugares do país vemos os sindicatos, os movimentos sociais e estudantis perdidos, sem força, sem referências esquerdistas. Eles que viviam da religiosidade de teorias ultrapassadas descobriram que seu deus está morto. Estão aí, com rubor no rosto, baixando a cabeça para os amigos simpáticos ao neocapitalismo que dizem: "E aí, esperamos mais um ano?".

UMA HISTÓRIA REAL


Desde os dez anos, eu cultivo uma admiração especial pelos Estados Unidos da América. Minha paixão começava nos filmes, no seu governo, no seu poder, na sua supremacia e se estendia até as revistas em quadrinhos, passando, é claro, pela música. Apliquei-me até no estudo do Inglês, no colégio e em casa. E ainda conversava com vários adultos que conheciam as faces e facetas dos EUA.

Certo dia, quando eu já devia ter meus onze anos, estava folheando a lista telefônica em minha casa, quando algo prendeu minha atenção. Ali estavam, à minha frente, os códigos telefônicos internacionais. Veio de repente a tentação de ligar para meu admirável país. Mas, e o preço? Isso não seria problema, pensei, basta ligar a cobrar. Peguei um pedaço de papel. coloquei o número nove no início, logo em seguida o código de Los Angeles (minha cidade predileta), e ainda uma combinação de cinco dígitos. Fui ao telefone e liguei. Ouvi uma voz feminina do outro lado da linha. Adorei! (mesmo sem entender uma palavra, nem dizer nada). Liguei novamente para o mesmo número. Que legal! Seria a minha expressão infantil de entusiasmo. Repeti o processo mais três vezes.

Um mês é passado, a travessura já em algum lugar no subconsciente, esquecida. Chega a conta telefônica, surpresa! Lá estavam cinco vezes a Palavra Estados Unidos. O custo das ligações? Meus dois olhos. Eu na minha ingenuidade, pensava ter ligado a cobrar. Minha mãe, na sua cumplicidade aos filhos, apenas comentou, mas alertou sobre meu pai. Fiquei apreensivo, não sabia qual seria a sua reação, nem que respostas eu iria dar às suas perguntas. Já estava escurecendo quando ele chegou em casa e nos encontramos. Ele foi logo perguntando, mas calmamente: "Para que você ligou para os Estados Unidos"? Eu, sem uma resposta interessante e satisfatória., balbuciei: "Por... curiosidade". - "Cinco vezes"? Ele pergunta. Fico calado, e para minha felicidade ele estava de bom humor. Não bronqueou nem me pôs de castigo. Mas provavelmente, eu só voltarei a ouvir um americano ao telefone, se alguma criança de lá cometer a mesma travessura, ligando para o Brasil, e acertar o número telefônico da minha casa.

GIZ


QUERO IR À ALEMANHA NA COPA*

*Artigo escrito na Copa anterior, mas seu mote vale para a da África do Sul deste ano.

Tenho sonhado todos os dias com uma dessas passagens para a Alemanha que empresas estão sorteando para promover seus produtos aproveitando a febre que ataca de quatro em quatro anos milhões de pessoas em todo o mundo, especialmente no Brasil, afinal, somos pentacampeões, a tão aguardada e festejada e divulgada Copa do Mundo de Futebol.

Não leio mais as matérias de jornais e revistas nem assisto mais a meus programas favoritos na TV. Meu tempo é investido em apenas folhear os periódicos, comprando até mesmo aqueles que antes não suportava nem em consultório dentário e zapear por canais e programas inúteis em busca dessas promoções, pois que outra oportunidade eu teria de conhecer a Alemanha? Sei pouco da língua alemã, serve apenas para aquelas frases intraduzíveis que lemos nos livros de filosofia vertidos para o português, mas isso pouco importa, usarei a boa e velha língua dos sinais. Inglês nem pensar, não quero ofender ninguém.

Tenho que ser sorteado. Uma significativa parte de nossa História está lá, inclusive algo de nosso esquizofrênico socialismo que não tem tido oportunidade de trabalho e que almeja ser comunismo, mas está com os pés no neo-liberalismo. A queda do muro de Berlim acabou com a utopia que ainda defendemos como ciência em nossas universidades.

Sonho ver sua arquitetura, ouvir seus sons, sentir seus cheiros. Ir aos museus. Caminhar pelo campus da universidade onde Einstein trabalhou e conhecer mais um pouco de Nietzshe e de Kafka. Ver sua realidade capitalista de alto desemprego e centenas de prédios comerciais abandonados. Quero colaborar com sua ascensão financeira, afinal o turismo é sua esperança, mesmo para um turista sem dinheiro como eu, dependente de promoção.

Ir ao estádio ver o Brasil jogar? Quem sabe. Futebol não me interessa nem um pouco, mas posso fazer um esforço.

MINHA MÃE LUCÍLIA


Altruísta. Seria esse o adjetivo que eu usaria para definir minha mãe em uma só palavra. Sempre dedicada aos irmãos na juventude, e aos filhos até hoje. Excelente dona de casa e “mãos de fada” na cozinha, seu talento especial, sempre fazendo guloseimas para a nossa alegria. Este ano fará 70 anos, com uma boa vitalidade, ainda que sofra de pressão alta.

De família grande e tradicional em Redenção, interior do Ceará, onde nasceu e morou a maior parte de sua vida. Bastante inteligente, estudou em colégios tradicionais de Fortaleza. Medrosa por excelência, tem medo de escuro, altura, velocidade e outros tantos mais. Sempre teve uma vida muito recatada, talvez por ser muito tímida, o que a sempre fez passar a maior parte do tempo em casa sozinha e quase nunca sair com amigas (que lhe são poucas).

Casou-se aos 22 anos e teve quatro filhos e uma filha, aos quais sempre foi muito devotada. Quase sempre parcial em seus julgamentos, coloca o amor aos filhos acima de tudo. Apego demasiado, mas sincero, às pessoas que ama, pois sempre esqueceu voluntariamente as próprias necessidades para dar-se aos filhos.

Publicado originalmente no jornal O Povo em 10 de maio de 2008.

Obs.: Encontrei a foto acima há alguns anos na coisas da minha mãe. É bem pequena, mas digitalizei e dei uma melhorada no photoshop. Infelizmente é a única foto que minha mãe tem de quando jovem.

SÃO FRANCISCO OU RONALDO?

Os que têm mais de vinte anos certamente se lembram de São Francisco, de quem tanto ouviram falar nas missas, em casa e nas conversas com os amigos. Os mais jovens talvez até já tenham ouvido falar, mas não têm certeza de quem seja. Contudo, sem dúvida conhecem Ronaldo, o Fenômeno.

Por quê? Porque o nosso modelo de herói mudou. Antes adorávamos ouvir histórias de gente rica que abandonava tudo em troca de um sonho ou de um grande amor. Hoje sonhamos com a riqueza para depois comprar o amor ou o sonho. O herói hoje é Ronaldo, que era pobre e ficou rico - não o criticando, já que ficou rico honestamente - e por ser realmente um craque. Quase diariamente vemos e aplaudimos as celebridades instantâneas e efêmeras que surgem na televisão. Nos vemos nelas. Sonhamos, através delas, nossas utopias individuais.

São Francisco hoje seria considerado louco, talvez fosse até internado ou ridicularizado em algum programa de TV por deixar a riqueza dos pais e partir em busca de seus ideais. Alguns certamente diriam ser ele um ''sonhador'', um outsider.

Roubar dos ricos e dar aos pobres como Robin Hood? Roubar tudo bem, mas para ficar rico, afinal, na nossa sociedade não importa de onde vem o dinheiro, importa que venha.

Consumir é o meio de atingir a felicidade. Os comerciais, como dizem os publicitários, não vendem mercadorias, vendem sonhos. Como alguém da periferia pode se sentir igual ao rico? Comprando o tênis ou a roupa de determinada marca, nem que sejam falsificados; sonhando é claro - e rezando -, com o dia que acertará os números da Mega-Sena.

Dinheiro é bom, concordo. Ou pode ser bom. Desde que não nos esqueçamos de que é mais importante ser do que ter, e não acreditemos em frases como: ''Dinheiro não traz a felicidade, manda buscar''. Ridículo.

Publicado originalmente no jornal O Povo em 14 de outubro de 2003.

SUPER-HERÓIS BRASILEIROS

Eles não são idolatrados, não têm revistas em quadrinhos nem filmes de Hollywood como os super-heróis americanos, mas quem acha que não existem super-heróis no Brasil está enganado.Eles existem sim, e nós os chamamos de jornalistas.E atualmente estão merecendo toda nossa admiração e respeito, pois como nunca estão denunciando, desmascarando e combatendo, por vezes sozinhos, a corrupção no Brasil. São eles que estão fazendo a sociedade brasileira sair de sua acomodação com a conjuntura política no Brasil. Se os brasileiros estão cobrando mais de seus representantes e fiscalizando suas ações é porque os jornalistas estão empenhados em revelar tudo que há de errado na política nacional.Estão, como os super-heróis da ficção, lutando por verdade e justiça.

Há quem pense que o Brasil nada mudou nas últimas décadas e há quem, absurdamente, sinta saudade da ditadura militar - claro, a memória sempre maquia o passado e a memória brasileira, sabemos, não é lá muito boa - acham que hoje tem muito mais corrupção que naquela época, mas não percebem que a corrupção no Brasil é histórica. Hoje, porém, devido ao destemor dos jornalistas, temos amplo conhecimento dela e podemos combatê-la.

O espírito jornalístico brasileiro é fortíssimo, mesmo quando forçados ao silêncio jornalistas bradaram contra as ditaduras que se estabeleceram por estas terras e agora, com a liberdade conquistada reportam ao grande público o que tem acontecido nos bastidores da democracia que ajudaram a consolidar. Além disso, mais jornalistas descomprometidos com ideologias partidárias têm surgido, o que proporciona um olhar cada vez mais objetivo dos fatos.

Hollywood tem feito filmes com Batman, Superman e Homem-Aranha, nosso cinema poderia fazer filmes com nossos super-heróis, que, melhor ainda que aqueles, são reais.

Publicado originalmente no jornal O Povo em 26 de agosto de 2006.

DESCALÇO

O pé
A pé
Descalço.

Sopé da montanha
Centro do caminho
Estrada carroçável
Fé pavimentada
Nulidades aprendidas

O OUTRO

o heterossexual criticou o
homossexual que estranhou o
bissexual que não entendeu o
pansexual que riu do
transexual que denunciou o
pedófilo que se indignou com o
zoófilo que repudiou o
masoquista que ridicularizou o praticante de
swing que desaprovou o
voyeur que se enojou com o
coprófilo, que censurou o
gerontófilo, que se surpreendeu com o
necrófilo, que rejeitou o
heterossexual que...

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # Edição Extra (Setembro de 2007) do grupo literário Luminários.

ESCOLHAS PROGRAMADAS

Seu brado será para montanhas distantes
Num dia frio que ela resolver subir o topo do mundo
Ela talvez o odeie
Ela talvez pense que ele foi seu único e verdadeiro amor
Coisa de mulher
Quem sabe trará consigo netos
Ela pensará nas escolhas dele
Fragmentos de dias passados dançarão em câmera lenta
Um desejo por um cigarro a incomodará
Ela se dará um abraço sentindo sua pele flácida
Algo a dirá que já foi feliz
Com novo sorriso pensará nas escolhas
E questionará se há destino
Terá esperança de uma nova vida
Sonhará com recomeços
Lembrará de seu jovem rosto
Dos olhos que a desejavam
Quererá voltar nas eras
Desejo de parar no tempo
Naquele dia que tudo pareceu perfeito
Que o beijo dele a apresentou aos devaneios
Seus olhos estarão no horizonte
Mas ela só verá os olhos sinceros dele
Ela saberá que foi de verdade
Ele a amou
Mas ele não se encaixava em planos
Não era possível decifrá-lo
Talvez não fosse possível que ele gostasse de alguém
Como se espera que se goste
Ele fora dado ao mundo
Um de seus netos talvez pergunte por que ela chora
Ela pensará na benção da vida
Efeito de perguntas inocentes
E pensará por que ele não acreditava
Por que ele se angustiava tanto
Que segredos existenciais ele sabia
Porém, mais que tudo,
Ela pensará se poderia ter dado certo entre eles
Se poderiam ter sido um casal comum
Se ele poderia consertar objetos caseiros quebrados
(O homem com quem casou é assim)
Concluirá que não, que quem ela amou
Amou por ser assim indecifrável e indeciso
Indiferente a problemas práticos e cotidianos
Que ele não caberia numa só ficção
Ele mesmo criava histórias
E algumas de suas melhores escrevera com ela

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 18 (Nov/Dez de 2007) do grupo literário Luminários.

DESESPERANÇA

mais uma vez alcoolizado
(única maneira de sobreviver!)
som do Era
luz de velas
um quarto fechado
penso no fim
penso no fim
penso no fim

tesão
(ainda vivo?)
oro para a Esperança
masturbo-me em sua intenção
ela me diz algo quase imperceptível
baixinho como queiram
foda-se! (sua voz suave)

ilusões incoscientes
medos dos pais
(nos destróem como quem sabe a verdade)

sucessão de acasos
disseram maktub
inócuo como dizer eu te amo

nada faz sentido
já haviam descoberto
mas o Departamento da Mentira
nos apagou a memória
e a Esperança, vadia,
se vendeu ao sistema
e me estupra
e enquanto gozo, creio
ela é profissional

acendo um cigarro
e me acredito vivo, imortal
(só porque escrevo esse poema)
mas creia-me
na eloqüência que só os drogados possuem
não sou mais que meu cérebro
(que podia estar até numa lata)
não vou a lugar algum
(nem você, seja quem for)
o fim é realmente o fim

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 17 (Set/Out de 2007) do grupo literário Luminários.

DRUMMOND 1

Quando nasci um anjo nerd,
desses de óculos e muitos livros
escreveu em se blog celeste:
“Aquele nasceu pra ser esquisito”
E venho em diferenças,
em leituras,
em músicas
em filmes
em games
que ninguém mais vê.
E riu o anjo geek comigo e de mim
na linguagem engraçada das orações:
“Tu nasceste Lisa Simpson.”
E sigo na sina de ser estranho à
família, aos outros, ao mundo,
em mais livros, em sonhos,
que ninguém conhece, que ninguém tem,
seguindo à parte, à margem,
nos guetos dos iguais
imperceptível,
mas vivendo por querer.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 16 (Jul/Ago de 2007) do grupo literário Luminários e no zine Portas para Poesia e Prosa (Outubro de 2007).

DRUMMOND 2

Quando nasci o anjo da inspiração suspirou:
“Cansei! Lá vai mais um a parafrasear Drummond”
E me disse um sermão:
“Adélia Prado viu o lado feminino, até gostei.
Chico Buarque pôs música e aqueles olhos verdes, já nem sei,
Torquato Neto briguei, Inglês?
Coitada da língua de Drummond
Já de você nada esperei, mas pensei, Nerd? Por que não?
Também tenho minhas esquisitices.”

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 16 (Jul/Ago de 2007) do grupo literário Luminários e no zine Portas para Poesia e Prosa (Novembro de 2007).

DRUMMOND 3

Quando o anjo nasceu eu é que pensei
Coitado, será esquizofrênico,
pois torto, esbelto, louco, safado e até nerd,
terá, no mínimo dificuldade
em saber sua identidade.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 16 (Jul/Ago de 2007) do grupo literário Luminários.

GATO NO TELHADO (De uns 15 anos atrás)

Na hora do sono profundo
Vem aquele sonho gostoso
Damos a volta ao mundo
Esquecendo os problemas

Andando pelo telhado
Vem o gato malhado
Quer acasalamento
Se divertir por um momento

Começa a miar
Fazendo a gente acordar
Que gato chato!
Eu quero descansar

Vai embora gato!
Perturba o vizinho
Olha que eu te mato!
Deixa eu voltar pro ninho

Ele vai embora
E volto a dormir
Que gato danado!
Nunca mais quero te ouvir

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 15 (Mai/Jun de 2007) do grupo literário Luminários.

EXCELSA ABSTRAÇÃO


Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 14 (Mar/Abr de 2007) do grupo literário Luminários.

DESVÃOS

Tu que passeias pela noite
Hora dos espíritos livres
Roubaste minha razão
Trouxeste-me nova vida
Sigo sôfrego sem olhar para trás
As amarras foram soltas

Imagino-te a cada instante
Refaço nossos beijos
Anseio teu reencontro

Paixão desvairada
Que invade o ser
E cria realidades
Nos desvãos entre certo e errado
Forbidden love but without prohibitions

Saí de mim mesmo
Abri-me para ti
Prevejo-te em meu futuro
Fiz pacto de amor

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 13 (Jan/Fev de 2007) do grupo literário Luminários.

ESCOLHA

Ouço a todo instante/ Não consigo decidir/ Entre o anjo e o demônio/ Eles têm longos cabelos/ Sigo/ Sucessão de fatos repetidos/ Entediantes/ Quero sentir/ Esbarro na maldição/ Não serei surpreendido?/ Não encaro meu eu futuro/ Medo de saber/ Fragmentos da Verdade/ Ilusão constante/ Até onde voltar para me trazer de volta?/ Ao que agrada ao anjo/ Ou ao que agrada ao demônio?/ Serei eu?

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 12 (Nov/Dez de 2006) do grupo literário Luminários.

ÊNFASE NO NÃO DITO

Sonhos não foram compartilhados/ Dores não foram contadas/ Medos silenciados/ Desejos ignorados// Perguntas que não foram verbalizadas/ Impulsos que não se tornaram abraços// Nasceram irmãos/ Cresceram desconhecidos

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 12 (Nov/Dez de 2006) do grupo literário Luminários.

MOMENTOS ROUBADOS

não me diga que será mais tarde
não me fale de trabalho
beije a loucura
(e a mim)
faça amor com o dessentido
(e comigo)
esqueça as horas
esqueça quem é
a realidade é relativa
a estrada parece não ter fim
chove

o líquido vermelho
agora
tom sobre tom no sangue

estes são
os perfeitos momentos
os poucos que livramos do destino
que nos fazem saltar para a transcendência
que nos fazem esquecer da arma em casa
quero mergulhar em seus olhos negros
misteriosos
quero saber de você
seu lado santa
seu lado bruxa
seus altares e suas fogueiras
eu não sabia que a cor me fascinava
veja minhas roupas
veja meus olhos
eles dizem as palavras não pensadas
sublimadas

quero o momento roubado da tarde
quero o presente do dia
quero outro momento de você

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 11 (Set/Out de 2006) do grupo literário Luminários.

EBULIÇÃO

Noite escura
Devaneios
Crise existencial
(mais uma vez)

Os sinos tocam
chamam-me de dentro de mim mesmo
(outros eus)

Faz sentido
Cansei-me da vida

Aquela garota
A mais interessante
Sabe ser a salvação
(mas como?)

Dilema

Um revólver ou uma mochila?

Fugir para sempre
Fim da realidade
Fugir sem destino
Uma nova verdade
Arqueologia de novas máscaras
Experiências não vividas
Cenas nunca vistas
Ou o medo e a covardia
Seis balas
Roleta russa sem falhas

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 11 (Set/Out de 2006) do grupo literário Luminários.

PROFECIA 14/28

sozinho
solitário
ele passeava em um barco no agitado mar noturno
ele havia sofrido uma desilusão amorosa
sabia que seu futuro era incerto
vendeu seu carro e sua casa para pagar dívidas de jogo
sua vida era um pesadelo de Sófocles
passeando frustrado em seu barco
o mar mais forte se agitou e a sua embarcação foi a pique
morreu
afogado!
afogado não pelas águas mas pelos problemas da impiedosa existência
esse homem pagou o preço da morte pela sua vida de incredulidade
ele era um homem sem certezas
mas um romântico
objeto sem sujeito

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 08 (Mar/Abr de 2006) do grupo literário Luminários.

PERIFERIA DO REINO


Para sua família foi um dia normal, com exceção dos contratempos de ter de providenciar os ritos fúnebres e a paga das despesas que eles provocam. Ninguém entre seus entes próximos diria que ele era o mais querido ou o mais engraçado. Nem entre os mais distantes. Sequer entre os poucos amigos.

Os sinos da pequena igreja do interior onde nascera replicavam o anúncio de mais um morto. As grandes portas da entrada não eram, sozinhas, suficientemente convidativas, pois ali era velado, pelos poucos que lá se encontravam por se sentirem na obrigação, alguém absolutamente comum. E ninguém gosta dos comuns, são espelhos.

Um dia lhe disseram que os lugares de morada no céu dependiam do número de pessoas em seu velório. Se muita gente, uma morada nobre, se poucas, na periferia do reino. Ele nunca acreditou.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 07 (Jan/Fev de 2006) do grupo literário Luminários.

SEGUNDA PESSOA

Você olhava para os olhos dela demonstrando nos seus todo o seu desejo contido de avançar em sua boca e beijá-la desesperadamente por todos os anos que a conhece e a cobiça. Atraído irresistivelmente por ela sem poder consumar o ato simplesmente por questões morais. Ela o ama, você sabe, mas a outros buscou entregar este amor. Você não suportava mais o riso dela, que escondia uma certa desesperança com a vida, que lhe negou uma paixão verdadeira. Inclinar a cabeça para trás, ao sorrir, balançando os longos cabelos, pareciam a qualquer olhar que não a visse de fato, felicidade. Apenas você sabia de sua dor. Somente você podia libertá-la. Somente você poderia estrangulá-la com as mesmas mãos que ansiavam acariciá-la. Unicamente você poderia atirar contra a própria cabeça em seguida. Você, a segunda pessoa mais importante para si mesmo. Ela, a primeira.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 06 (Nov/Dez de 2005) do grupo literário Luminários.

PELOS EXCLUÍDOS

Sou índio soul
Sou idoso soul
Sou mulher soul
Sou criança soul
Sou deficiente soul
Sou prostituta soul
Sou homossexual soul
Sou nordestino soul

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 05 (Set/Out de 2005) do grupo literário Luminários.

LIVRE

Não falo mais.
Me calarei sempre.
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–?
Não entendeu o que eu disse?

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 05 (Set/Out de 2005) do grupo literário Luminários.

EM NOME DO NADA

Ei, você!
Que pensa que tá indo tudo bem na sua vida,
Que comprou um celular último modelo e pensa que realizou o último sonho,
Que acha que só a sua religião levará para o céu,
Que arranja algumas mulheres por causa de uma moto ou carro e se acha o gostoso,
Que tenta casar com um homem rico pra resolver o futuro,
Que trepa nas noites de quinta depois da novela das oito, sem nenhuma emoção,
Que não se emociona com um filme ou uma música,
Que nunca leu um livro sequer,
Que não sabe nada de política e economia,
Que vai trabalhar todos os dias tomando o mesmo caminho,
Que tem uma profissão que odeia, só pelo dinheiro,
Que não confia em ninguém nem é confiável,
Que acha que ser nacionalista é ver o jogo da seleção de futebol,
Que nunca reivindica seus direitos,
Que tem raiva de quem se destaca,
Que acha que o dinheiro é solução pra tudo e compra a todos,
Que se conforma com a mediocridade,
Que já não sonha na cama antes de dormir,
Que não é o que pensa e sente por vergonha ou medo,
Que não vive a própria vida pensando na dos outros,
Que não conhece nada além de seu próprio mundinho,
Que vive criticando por inveja o que adoraria fazer,
Que não tem nem consciência de que está vivo,
Ei, você!
Ser patético e desprezível,
Acorde!
Sinta de verdade,
Ame de verdade,
Trepe de verdade,
Saiba de verdade,
Seja de verdade,
Sinta de verdade!

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 05 (Set/Out de 2005) do grupo literário Luminários.

TERCEIRO OLHO DO POETA

A noite diz:
Tudo que vocês quiserem
O vermelho já há muito corre nas veias
Não o sangue, mas o que inspira.
Um deles diz:
Vocês sabem o que nos diferencia dos animais? A História.
Não entendemos nada, mas diz muito.
Somos primitivos, instintivos,
Somos puro ID e gritamos com The Doors:
"Come on baby, light my fire
try to set the night on fire
(Venha, baby, acenda meu fogo
tente por a noite em chamas)"
Algo quer sair de dentro de nós, talvez os demônios de Platão?
A mesa da comunhão vira instrumento musical.
Falamos muito e fingimos entender.
E nos desentendemos com nós mesmos, com o mundo, com os outros.
Queremos desformar a forma.
E choramos com a dialética da construção e da desconstrução.
E somos a um só tempo únicos e perdidos em doces ilusões.
Formulamos teorias que irão mudar o mundo.
E pensamos em nós mesmos.
Bêbados, cheirando à fumaça de nossos cigarros misturada aos sons do Pink Floyd:
" At a higher altitude with flag unfurled
We reached the dizzy heights
of that dreamed of world
(Em alta altitude com a bandeira desfraldada
Alcançamos as alturas inebriantes
daquele mundo de sonhos)"
Verdadeira face para a família? Um deles pergunta.
E quem somos nós? Seguimos perguntando.
Muitos porta-retratos sem as fotos de sorrisos congelados.
E seguimos entendendo o mundo, drogados e lúcidos.
Vemos os átomos e os atos hipócritas.
E achamos e pensamos tantas elucubrações alcoólicas.
Desmentimos tudo em seguida.
Mente em movimento,
Língua solta,
Palavras desconexas que explicam tudo.
Nos sentimos casados com o mundo,
Transamos com ele em mais de cinco sentidos conhecidos.
O terceiro olho está aberto e vemos coisas que ninguém mais vê.
E vemos fantasmas. Um poeta como nós. Há tempos desencarnado.
Henry David Thoreau.
E nos diz:
"Hey, guys!, vejo que vocês estão vivendo minhas palavras:
'To put to rout all that was not life
and not, when I had come to die,
discover that I had not lived
(Fazer apodrecer tudo que não era vida
E não, quando eu morrer,
descobrir que não vivi)'"
Gritamos, dançamos, vivemos,
Fomos ao bosque. E nos sentimos vivos.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 04 (Jul/Ago de 2005) do grupo literário Luminários.

POLÍMNIA

Para ele tudo parecia novo. Não reconhecia seu rosto no espelho, seus amigos, sua família. Os dias se passavam num ritmo descompassado. Um sonho desconexo e sem linearidade, mas estranhamente real.

Em um de seus instantes de encarnação do que fora se viu lutando e dizendo palavras sem sentido para sua mãe e seus irmãos que tentavam dominá-lo. Lembrou-se apenas de sua profissão. Escritor. Mas isso não trazia luz à escuridão de seu hipocampo. Viu-se impelido a agarrar o pescoço de sua mãe. Noutro fragmento das imagens turvas que lhe chegavam à visão e à sua mente cambiante, era exatamente o que fazia. Se sentia beijado por Polímnia, musa das palavras. Os sons da luta pareciam distantes. Os irmãos batiam nele como se em lentos movimentos.

A voz do psiquiatra ainda era distante e sua imagem turva, mas entendia perfeitamente o que ele dizia. De um ímpeto levantou da cama. O psiquiatra segurava um calhamaço. Era o trabalho de anos de seu paciente. Assassinatos em troca de inspiração. O médico o ajudava nos crimes.

Sua mãe estava morta. Suas lembranças o confundiam. Seu corpo estava mutilado - o preço da inspiração quando não conseguia matar ninguém. Fugiu pra viver novas vidas.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 03 (Mai/Jun de 2005) do grupo literário Luminários.

CASA COMUM

Polímnia é teu nome
Musa da eloqüência
Me arrancastes as palavras
Conexas, diversas
Perdidas na descrença do livro dos destinos
Criadas na inconsciente esperança
Que lembra a anterioridade
E anseia o porvir

Profeta comum
Parábolas diversas
Reencontro atemporal
Espaços quânticos
Realidades furtivas
Sentidos aguçados dos amantes iluminados
Metafísica milenar
Poções alquímicas
Harmonia ancestral

Os personagens da fotografia descongelam
E caminham. E rumam para a via-láctea
A estrela chama
Voltarão para casa

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 02 (Mar/Abr de 2005) do grupo literário Luminários.

EROS RING MY BELL (OU DO DEVIR)

Idéia, sede, visão
Fonte, água, desejo, mergulho
Pressão, voracidade, antropofagia, volúpia, luxúria
Sagrado e profano
Caos/cosmos
Espasmo, relaxamento
Saciados...
Ávidos por mais.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 01 (Jan/Fev de 2005) do grupo literário Luminários.

NOVE ANOS (Para Darlan)

Sei que não podes ler nada do que escrevo, mas desejo que estas linhas tenham o poder de levar o que sinto onde quer que estejas. Adoraria ter de novo nove anos e mais uma vez te abraçar por tua volta pra casa depois de tua saída involuntária. Queria passear de novo de carro contigo, mesmo que não me dissesses nada, sabia que você queria que eu me divertisse. Queria que você me guiasse segurando no meu pescoço quando passeávamos a pé. Queria que, quando eu saísse do colégio, você estivesse me esperando e me trouxesse na garupa de sua bicicleta. Queria que me dissesses de novo, quando queria me irritar “você é o besta!” E eu respondesse “Você é o sabido!”. Queria te acordar de novo de manhã, mesmo que fosse, molecagem, com uma alfinetada. Queria de novo te pedir dinheiro. Queria crescer com você, mesmo que discordasse do que eu fizesse e brigasse comigo. Queria ter você na minha formatura.

Hoje eu queria poder conversar contigo e saber quem você é, do que você gosta, queria que você soubesse de mim. Suas antigas fotografias não me revelam tudo a seu respeito. O que me dizem não é você.

Agora é você que tem nove anos e às vezes não tenho paciência, como quase nunca temos com as crianças, mas vai estar sempre comigo como parte de você, mesmo que eu quisesse que sua vida tivesse tomado outros caminhos, os dias que me sento com você e falo bobagens para fingir para mim mesmo que estamos conversando, das vezes que lhe dou, escondido, chocolate ou outras coisas que engordam, quando lhe mostro a playboy pra que mates, parcialmente, a saudade das mulheres, que nunca esquecemos, mesmo na sua condição, de quando eu morava longe e falava com você por telefone e o arrependimento por não ter feito fisioterapia ou terapia ocupacional pra cuidar de você, mas depois do trauma eu só poderia ser sociólogo e psicólogo e cuidar dos traumas sociais e pessoais dos outros. Espero que não seja o fim e um dia eu possa te encontrar num lugar onde possas ser você e a gente se conheça como agora não nos conhecemos. Que não sejamos mais condenados a um de nós ter nove anos, que se encontrem nossos meninos e nossos homens.

Um abraço de felicidade pura como aquele que só quando crianças podemos dar.

O MITO DO SUPER PROFESSOR

Chegamos ao início de mais um ano letivo. Nesse instante, milhares de professores estão extremamente ansiosos, se preparando para o retorno às salas de aula, onde, se espera, sejam educadores, conselheiros, bons oradores, incentivadores, exemplos, por aí vai, a lista é enorme.

O foco da pedagogia moderna está no aluno, ou melhor dizendo, no cliente. Sim, já que muito do que se faz hoje nos nossos bons colégios públicos e particulares é agradar o máximo possível aos alunos para mantê-los e para mostrar estatísticas positivas, seja de não reprovação, ainda que não aptos, ou como argumento publicitário, quando passam em faculdades e universidades. Para se conseguir isso é necessário passar toda a responsabilidade para o professor. É ele que precisa fazer o aluno gostar da matéria e de estudar. Se o aluno fracassa a culpa é transferida integralmente para o mestre.

Nossos pedagogos de gabinete de faculdade, que há muito deixaram as salas do Ensino Fundamental e do Ensino Médio - alguns por lá nunca passaram, se esquecem, às vezes, que lidamos com gente. Pessoas problemáticas, influenciadas pela família, religião, pelo mundo do entretenimento. Formadas pela cultura da mediocridade, num país onde se tem vergonha de ser estudioso, de ser inteligente, de se destacar. Onde não se premia nem se incentiva os melhores. Mas, dizem, se o professor for um bom ator/animador e fizer aulas dinâmicas, mesmo que esqueça o conteúdo e o pensamento abstrato, os alunos adorarão. Evidente que sim, vivemos na sociedade do espetáculo, no dizer do filósofo francês Guy Debord, o entretenimento é supervalorizado. Não se lembram da matéria de biologia, mas das piadas do professor, sim.

Naturalmente, quanto mais talentos tiver o professor melhor para o aluno que estude por prazer, não por ofício, mas ao contrário do que andam dizendo por aí super-homens e super-mulheres não são professores.

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO I


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Janeiro de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO II


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Fevereiro de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO III


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Março de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO IV


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Abril de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO V


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Maio de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO VI


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Junho de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO VII


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Julho de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO VIII


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Agosto de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO XI


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Setembro de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO X


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Outubro de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO XI


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Novembro de 2008)

DO PONTO DE VISTA DO ORNITORRINCO XII


Publicado originalmente no fanzine literário Do Ponto de Vista do Ornitorrinco (Dezembro de 2008)

CORRESPONDÊNCIA SOBRE NADA

Ainda criança foi vítima de um acidente de carro que lhe deixou paraplégica. Pai dirigindo bêbado, festa de fim de ano, noite de alegrias. Ele e a mulher mortos. Filha gravemente ferida. Nada de novo, histórias que se repetem. Foi morar com os avós. Classe média alta. Não havia nada que o dinheiro não pudesse lhe comprar. Foi-lhe dado um mundo particular, onde todos os habitantes imaginários andavam de cadeira de rodas.

Não deixaram – e ela mesma não se sentia capaz – de enfrentar o mundo dito real. Nada de escolas, nada de faculdade, nada de carreira profissional, e nada, do melhor que permeia tudo isso, namorados, festas, porres, sexo, amizades falsas e verdadeiras, amantes. Tudo isso lhe parecia cenas de filmes que via e de livros que lia.

Sua maior diversão, na qual se sentia parte do sistema, era fazer cursos por correspondência. Na puberdade adorava ler os quadrinhos de anúncio do Instituto Universal Brasileiro nas revistas Disney que lia. Aquelas mensagens motivacionais em forma de arte seqüencial eram seu livro sagrado. Trazia-lhe um sentido – banal como todos – de viver.

Nunca sonhou seguir nenhuma profissão, mas se capacitou em muitas delas através dos cursos. Os responsáveis pelas correspondências do curso nunca perceberam um nome insistente nos registros de matrícula.

Publicado originalmente no folheto literário Do Ponto de Vista do Hipogrifo em maio de 2008.
Aos que fizeram história no SPD, Turma do War, Círculo do Inferno, Luminários e para os (pós-tudo) que continuam a fazer.

Aconteceu o que ninguém esperava. Naquela tarde e noite de sábado, o banco da praça estava vazio. Aqueles amigos que pareciam aos olhos de todos, esquisitos, que pertenciam a uma realidade diferente, haviam sumido.Ninguém soube explicar o porquê.

Aquele estranho grupo havia se tornado há um só tempo objeto de admiração e folclore da cidade. Um antigo prefeito, um dos membros da seleta confraria, mandara colocar estátuas dos mais assíduos ocupantes do banco, bem debaixo da velha árvore.

Naquela moderna e interiorana ágora mundos foram criados, teorias foram desconstruídas, sonhos foram produzidos, mulheres se inebriaram, desmaiaram de paixão.

Não se sabe o que aconteceu com aqueles baluartes. Uns acreditam que foram simplesmente embora para outra cidade, outros dizem que desistiram e se misturaram aos outros humanos, os que lhes punham mais fé e lhes acreditavam anjos, dizem que voltaram para o lar divino.

Só eu sei a verdade. Eles vieram para mudar vidas e fizeram seu trabalho. Não tinham temor por nada, a não ser por envelhecerem. Fugiram para um lugar espiritual onde isso jamais poderá acontecer...


Psicografado por Lorde Henry. De um espírito que fez parte dos quatro grupos quando em vida.

Publicado originalmente no folheto literário Do Ponto de Vista do Hipogrifo em Abril de 2008.

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Publicado originalmente no fanzine Dobradinha do grupo literário Luminários.

APOLOGIA DO ÓCIO

Entreguemo-nos relaxadamente à preguiça!
Ao prazer de, vazios, absorvermos as cores alienantes da tela do vídeo.
Um sem fim de páginas de tantos volumes para quê, se podemos gozar da sensualidade da improdutividade?
Que se dane o mundo! Deixem-nos estéreis mesmo, em um canto qualquer de um quarto úmido, contentes com o pouco que temos e com o nada que construímos.
Sejamos mudos! Só os loucos gritam, argumentam e reagem.
Que se fabriquem sempre expressões de contentamento para ficarmos eternamente absortos e absorvidos com a usurpação do nosso direito de sermos humanos e humanizados.
Vamos praticar desatinos com os que confeccionam sonhos e se cansam para democratizá-lo; são somente pândegos, não são sérios.
Que mal há em não querer mudar o mundo? It’s a waste of time!
Apaguemos as luzes e deitemo-nos impotentes diante da nudez.

Publicado originalmente no jornal Em Formação em maio de 2003.

PÓS-MODERNIDADE E O PACTO MUNDIAL DE LULA

Desde o Iluminismo, com a queda da teologia do centro das decisões, diversos líderes, intelectuais, políticos e economistas têm pensado em um ethos mundial, algo que norteie as decisões políticas internacionais.Hoje vivemos no período a que se convencionou chamar de pós-modernidade. As verdades absolutas são questionadas, dando lugar a verdades relativas aos contextos históricos.

Ninguém mais precisa seguir fielmente ideologias políticas ou religiosas. Pode-se muito bem fazer um self-service do que mais agrada a seus valores pessoais. Testemunhamos o ecumenismo religioso, a fusão de grandes empresas e a pregação da Terceira-Via (tentativa de unir o que há de melhor da Esquerda e da Direita).Somente nesse contexto atual, o presidente Lula pode abrir mão de algumas posições mais radicais para se abrir ao diálogo. Ele faz parte desse fenômeno e pode se tornar o grande líder desse período, sendo o elo entre as grandes corporações, investidores e políticos e as vozes vindas do povo, da classe média, dos intelectuais.

Com seu evidente dom de liderança, seu carisma e as transformações ideológicas atuais, Lula tem nas mãos a chance de fazer o que ninguém mais pôde. Articular uma nova ordem nacional - o que ele chama de pacto social. Pode iniciar uma coalizão de forças econômicas, políticas e sociais. Unir sagrado e profano.

Publicado originalmente no site http://www.unifor.br/ em 2003.

MICROFÍSICA DA CORRUPÇÃO

Há vários anos jogo War com meus amigos de infância. Ao longo do tempo mudamos todas as regras e fizemos novas cartas. No entanto, quase sempre as partidas terminam em briga. Cada participante defende ou critica determinada regra,dependendo de seu interesse e sempre voltamos a mudá-las.

Temos, no Brasil, um comportamento semelhante. Sempre achamos que as regras não se aplicam a nós e que os outros são desonestos. Atacamos fervorosamente o Governo Federal, os estaduais e municipais. Acreditamos que o país não progride porque os governantes só roubam o dinheiro público.

Porém, não percebemos que a corrupção está instalada em todos os níveis sociais e profissionais. Na sonegação de impostos, na exploração dos funcionários, no contrabando, nos trabalhos escolares prontos, na pirataria etc.Temos uma longa tradição histórica de exploração e corrupção, desde os tempos coloniais e fazemos de tudo para perpetuá-la. Somente quando nos dermos conta que é necessário uma transformação individual e nas micro-relações é que podemos transformar toda a sociedade. E não continuar a criticar o governante corrupto e sonhar estar no lugar dele para também usufruir do dinheiro e do poder, ao invés de denunciar e cobrar, e dar o exemplo de cidadania e de cidadão honesto. Além das reformas da previdência, tributária e política,necessitamos de um reforma pessoal e moral.

Publicado orginalmente no site http://www.unifor.br/ em 2003.

SONS E ESPELHOS

You reached for the secret too soon
Threatened by shadows at night
(Shine On You Crazy Diamond-Pink Floyd)

Era uma pacata cidade do interior. Vidas simples que sublimavam temores pelas estranhas e misteriosas mortes que por lá haviam. Quem por ali passava não podia imaginar as orgias, rituais, profanações e pecados ocultos pela noite. Era melhor não saber de nada. A polícia se mantinha fora. Os casos eram resolvidos da maneira mais simplista. Talvez fossem somente desajustados sociais que queriam chamar atenção pra si. K. sabia que não. A maldição das estranhas mortes era uma realidade. Os caixões fechados nos velórios ocultavam as faces disformes das... ele relutava em chamar de vítimas. Eles quiseram isso, eles clamaram pelo que aconteceu. Adoradores da morte.

Não havia muito a se fazer naquela cidade. Os talentos eram consumidos pelo álcool e por outras drogas. Esquecidos lá, na periferia do mundo real. K. amaldiçoava todos os dias aquele lugar. Queria ser músico, era bom, sabia, mas nascera no sítio errado. Todas as noites tocava seu saxofone no porão que havia construído para esse fim. A população se acostumara, não sem irritação, com aquele som distante e surreal como num fim de sonho. A casa de K. distava da cidade, mas as notas musicais voavam na noite e caíam por sobre os telhados, entravam pelas janelas e já quase imperceptíveis morriam nos ouvidos adormecidos da maior parte da população. Eram as notas de sua maldição sobre a cidade que o impedia do sucesso. E K. continuava tocando, pedindo a qualquer entidade oculta que se manifestasse e acabasse com seu sofrimento.

E ela surgiu. Na madrugada quente da periferia do mundo. K. tinha o dom. E foi escolhido. Hoje, quando celebra o pão e o vinho e ouve as confissões dos culpados, sabe que seu chamado não foi pra isso, mas para o que realizou no passado, na longínqua cidade. Não foi difícil achar seguidores. E no meio dos seis ceifadores, de campos e de vidas, L., sua companheira até o dia em que [esta] também apeteceu.

A música era seu guia. Através dela eles sabiam aonde ir. E toda noite que alguém desejava a morte ao som de uma música profana, eles concediam. Os adultos não comentavam na frente das crianças nem quando a noite se aproximava, dos estranhos suicídios, nos rostos irreconhecíveis, nos símbolos marcados nos corpos. E K. continuava a tocar à noite, a gravar nos inconscientes que sonhavam fornicando com a morte o ritual hipnótico para conhecê-la. E como numa onírica luxúria ouviam as músicas não consagradas e as adoravam e cobiçavam a morte e ansiavam por seu encontro.

Seis ceifadores, sessenta e seis ceifas. K. não dorme mais. Nada lhe adiantou o caminho da fé. A culpa não foi embora. E mesmo depois de duas décadas, ao fechar os olhos ainda vê L. sem a pele da face, pendurada numa corda. Ela ansiou pela morte, ele desesperou-se e seus seguidores o traíram. A Morte o traiu. Não, L., não sua amada. Ela o fez esquecer o seu desprezo e maldição à cidade. Ele romperia o trato que fez na madrugada quente. Depois da missa ele subiu à torre da igreja e ouviu as musicas não consagradas. E desejou a morte e se imaginou fazendo amor com ela. Ela estava lá. E ele pulou ao seu encontro.

Publicado originalmente no jornal O Benemérito em maio de 2004.