TERCEIRO OLHO DO POETA

A noite diz:
Tudo que vocês quiserem
O vermelho já há muito corre nas veias
Não o sangue, mas o que inspira.
Um deles diz:
Vocês sabem o que nos diferencia dos animais? A História.
Não entendemos nada, mas diz muito.
Somos primitivos, instintivos,
Somos puro ID e gritamos com The Doors:
"Come on baby, light my fire
try to set the night on fire
(Venha, baby, acenda meu fogo
tente por a noite em chamas)"
Algo quer sair de dentro de nós, talvez os demônios de Platão?
A mesa da comunhão vira instrumento musical.
Falamos muito e fingimos entender.
E nos desentendemos com nós mesmos, com o mundo, com os outros.
Queremos desformar a forma.
E choramos com a dialética da construção e da desconstrução.
E somos a um só tempo únicos e perdidos em doces ilusões.
Formulamos teorias que irão mudar o mundo.
E pensamos em nós mesmos.
Bêbados, cheirando à fumaça de nossos cigarros misturada aos sons do Pink Floyd:
" At a higher altitude with flag unfurled
We reached the dizzy heights
of that dreamed of world
(Em alta altitude com a bandeira desfraldada
Alcançamos as alturas inebriantes
daquele mundo de sonhos)"
Verdadeira face para a família? Um deles pergunta.
E quem somos nós? Seguimos perguntando.
Muitos porta-retratos sem as fotos de sorrisos congelados.
E seguimos entendendo o mundo, drogados e lúcidos.
Vemos os átomos e os atos hipócritas.
E achamos e pensamos tantas elucubrações alcoólicas.
Desmentimos tudo em seguida.
Mente em movimento,
Língua solta,
Palavras desconexas que explicam tudo.
Nos sentimos casados com o mundo,
Transamos com ele em mais de cinco sentidos conhecidos.
O terceiro olho está aberto e vemos coisas que ninguém mais vê.
E vemos fantasmas. Um poeta como nós. Há tempos desencarnado.
Henry David Thoreau.
E nos diz:
"Hey, guys!, vejo que vocês estão vivendo minhas palavras:
'To put to rout all that was not life
and not, when I had come to die,
discover that I had not lived
(Fazer apodrecer tudo que não era vida
E não, quando eu morrer,
descobrir que não vivi)'"
Gritamos, dançamos, vivemos,
Fomos ao bosque. E nos sentimos vivos.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 04 (Jul/Ago de 2005) do grupo literário Luminários.