TRANSIÇÃO



Em qualquer lugar em que eu estiver as estrelas serão azuis
Mesmo sem teto verei seus tons

Minha cor permanecerá a mesma
Diagnóstico preso numa canção de blues

Sempre fui temporário
O instante insatisfeito do paroxismo
Quatro passagens de tempo é só mais um número arbitrário

Nunca estive em casa, pensamento sem formas de encaixe
Disfuncionais

Na sua, talvez por um momento
Até fiz barulho, fui eu
Algo de adulto, paleta maior de cores
Para além da constância do azul

Mas eis que se apresentam um novo festival de salas
Vazios a serem imaginados
Lugares por desenhar
Chuveiros que não aplacam o calor

Sincronia dos móveis daquele que nunca teve relação com o tempo
E eu que tudo experimento no agora, sem mudanças
Porque constante, intenso – embora racional

Sinto tudo a memória inteira

Meu lugar é minha mente
Escondida, quem sabe, em algum lugar do cérebro
Pilhas de endereços paralelos

Sinestesia bagunçando sentidos
Muito mais que branco, bem mais que vermelho
Sempre presente com quem melhor se torna
Por elas feito estranho na descrição

Tudo bem agora, mas e no futuro?
Serão devir, significarão páginas escritas
Serei eu?

TUDO QUE QUERO É APRENDER COM AUTISTAS

Já é uma tradição pessoal no meu aniversário ir ao cinema, comprar livros, HQs, comer fast food. Na verdade nada muito diferente do que costumo fazer frequentemente. E hoje essa tradição teve um filme especial dada a minha pesquisa e atividade profissional com o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Fui ver o filme Please Stand By, na tradução esquisita Tudo Que Quero (2018). O título em Inglês tem uma razão de ser no filme, acerca de se desorganizar/organizar.


Dakota Fanning está perfeita no papel de Wendy, uma jovem adulta com autismo e fã de Star Trek, que até mesmo escreve Fanfic da série. Combinação perfeita de tudo que gosto. Wendy é órfã e mora numa espécie de casa para autistas. Curiosamente a palavra autismo não aparece em nenhum momento do filme, embora esteja lá presente e percebemos o quanto o mundo pode ser difícil para alguém com essa condição, com essa identidade. Nem mesmo a profissional de saúde que dirige e mora também no lugar é descrita com psiquiatra ou psicóloga, ou outra atividade.

O filme é um road trip emocionante, Wendy vai para Los Angeles para entregar seu roteiro para participar de um concurso do estúdio de Hollywood que produz Star Trek. E seguimos vendo todos os desafios que alguém com autismo enfrenta no mundo real fazendo uma viagem sozinha. Sobretudo com aproveitadores, desonestos, sacanas, pilantras de toda espécie que aprecem no caminho.


E na sua sinceridade, falta de maldade e de teoria da mente na verdade nos mostram o quanto podemos aprender com eles. Afinal, já disse muitas vezes, e não digo isso de modo romântico, podemos aprender muito com os autistas. Eles estão muitos distantes na evolução humana, pertencem a outra categoria, a outro lugar, onde os humanos não são aproveitadores dos outros, onde a sinceridade e a bondade são os parâmetros.

Enquanto isso o que estamos fazendo é mostrá-los o quanto o mundo é feio e prepará-los para terem autonomia e não se deixarem enganar por ninguém. Mas o quanto seria bom se na verdade estivéssemos é aprendendo que o mundo pode ser melhor, mais sincero e só nos preocupássemos com o que importa para nós mesmo. Como Wendy e sua paixão por Star Trek.