SÍNDROME DE CHAVES

Todos os anos se repetem as cenas que nos deixam angustiados diante da televisão. Cenas de miséria e fome que assolam o país, sobretudo no Nordeste. Crianças desnutridas, pai desempregado, mãe que chora diante das câmeras, farinha e raízes na panela sobre o fogão à lenha, mexem conosco. Lembramos da nossa geladeira farta e do peru de Natal e das nozes que planejamos comprar para a ceia, obrigatória no que pensamos ser um Natal feliz. Pensamos no assunto um minuto ou dois antes de dormir, planejando, quem sabe, doar alguns quilos de alimentos para uma campanha de solidariedade de final de ano, satisfazendo com isso a nossa consciência, em algum lugar dentro de nós perdida, sufocada pela idéia de que não somos responsáveis.

Esse comportamento se assemelha ao das pessoas que moram na vila do seriado Chaves. Todos que lá residem sabem que o protagonista da série, o garoto Chaves, é órfão e pobre, sempre com grande fome e a desejar seu prato favorito: sanduíche de presunto. Seus amigos (amigos?) se solidarizam, sentem pena e às vezes lhe dão algo para comer, mas logo tudo é esquecido e ninguém faz nada para, de fato, resolver o problema de Chaves, que é bem simples: fome.

Sempre nos finais de ano a consciência coletiva se modifica, embalada pela mídia e pela religião. É o momento da partilha, da solidariedade. Pensamos, culpados com nossa ceia que será variada, nos que não têm nada para comer. Dizemos aos nossos filhos que o Natal lembra o nascimento de alguém importante, cuja vida foi exemplo de altruísmo.

Grupos de conscientes com seu papel social se formam e coordenam grandes movimentos que inspiram os que foram dormir se sentindo culpados com as cenas que viram no jornal. São várias as campanhas para um Natal sem fome, onde todos possam comer e sonhar com um Papai Noel vestido com sua roupa de frio, na esperança de que de fato ele exista e venha acabar com tanto sofrimento na terra do sol. Damos esmolas, sejam materiais ou de afeto, pensando mais na satisfação que estas atitudes nos trazem do que nas necessidades de quem estamos ajudando (usando?). Que me perdoem as Ongs e os grupos religiosos que coordenam as campanhas de arrecadação de alimentos, mas e o resto do ano?

Texto publicado originalmente no jornal O Povo de 29 de dezembro de 2008.

MEDICINA: CIÊNCIA INEXATA

Nenhuma ciência é exata, é verdade; mas a medicina, com sua aura de detentora da verdade e os médicos fantasiados como os heróis salva-vidas, deveriam chegar mais vezes a consenso sobre diagnósticos e tratamentos.

Um dia se vai ao médico e ele diz que o caso é grave, tem que se mudar de imediato a dieta, fazer exercícios, comprar várias caixas de remédios e mudar radicalmente a rotina diária. A angústia pessoal é passada à família, orações são feitas, relacionamentos mudados, muitas lágrimas são derramadas.

Alguém, depois de algumas semanas, sugere pedir a um outro profissional, uma segunda opinião. O segundo médico alivia a tensão dizendo que o caso é simples, um tratamento leve reverterá o problema. Alívio geral.

Mas a pergunta é inevitável: Quem está com a razão? Leigo, com medo de morrer, o enfermo recorre até à Internet em busca de informações sobre a doença, que, não raro, simplifica demais o que os médicos teimam em complicar para que os meros mortais não iniciados nas ciências ocultas da saúde não entendam.

O sofrimento permanece. Qual dos dois diagnósticos seguir, já que são baseados na subjetividade do médico e de seu conhecimento parcial sobre o ser humano e suas idiossincrasias? Com um pouco de bom senso e, naturalmente, medo de tomar uma decisão errada, tenta-se um caminho intermediário com um novo alopata, enquanto consegue pagar o plano de saúde ou mendiga vagas da rede pública. Mais confusão. Os médicos não seguem o que apregoam os orientais, isto é, o caminho do meio.

Com a imprecisão dos médicos chega a vez dos caminhos alternativos. Homeopatas, médicos espirituais e tratamentos holísticos os mais variados. Mais remédios, mais poções, mais orações, mais distantes da cura. Daí descamba para a medicina popular com suas crenças, ervas e grãos. Com um pouco de sorte se sobrevive.

SAUDADE DE FORTALEZA BOÊMIA

Sexta-feira à noite. Fortaleza. Havia convidado dois amigos do interior para uma noitada na capital. Animados, fomos a Osório de Paiva, seria bom um bar com bandas covers de rock, depois um outro com forró. Decepção. A avenida estava quase deserta. Não era um dia atípico, véspera de feriado ou algo assim. Achei que estivesse por fora da animação da cidade. É periferia, talvez fosse melhor ir logo à Praia de Iracema. Lá, o que encontramos foi bares e restaurantes fechados e pouca gente na rua. A única saída era pagar pra ficar numa boate ou clube fechado, escondidos do mundo.

O que há com nossa cidade? Lugar que se orgulhava de ser boêmio, festeiro, “melhor segunda-feira do mundo, imagine os outros dias” era o slogan. Medo da violência? Há tanta violência assim para termos tanto medo e ficarmos trancafiados em casa com nossas tvs, dvds, internet com seus programas de relacionamento, vídeo-games com jogos que simulam a vida lá fora? E quando resolvemos sair nos cercamos das paredes dos shoppings, dos clubes e de boates ou casas de amigos, com cerveja, karaokê e, na nossa consciência, segurança.

Um amigo me disse que estava querendo muito ir morar no interior, porque a violência aqui está muito grande. O interessante é que esse amigo nunca foi assaltado, nunca sofreu nenhum tipo de violência e não conhece ninguém que tenha sido. É claro que só um louco alienado diria que não há violência, porém, talvez não seja tão grande como estamos acreditando, que o mundo nunca esteve tão violento. Hoje temos amplo acesso à informação e casos isolados de violência nos chegam constantemente, nos dando a sensação de barbárie. Imagine no passado os assassinatos e lutas até a morte no coliseu, os enforcamentos em praça pública, o faroeste e, em nossas terras, cangaceiros matando pessoas pelas ruas. Fortaleza parece bem melhor agora.

NÃO QUERO TER FILHOS!

Não quero ter filhos! A reação é de estranheza em todos que me ouvem fazer tal afirmação. Muitas vezes ficam indignados e não raro parecem sentir pena de mim. Provavelmente pensando em como sou egoísta.

Mas lhes dou razão, não quero mesmo ter filhos por razões puramente egoístas. Filhos demandam muito do nosso tempo. Nosso tempo de vida é muito curto, quero fazer muitas coisas que, se tivesse filhos, não teria tempo para realizá-las. E filhos custam muito dinheiro. Prefiro gastar o que ganho realizando meus próprios desejos em vez de atender aos desejos, muitas vezes tiranos, dos filhos.

Mas você não gosta de crianças? Perguntam sempre. Pra falar a verdade, não muito. Talvez quando ainda são bebês. E, muitos parecem não ter percebido, seus descendentes não permanecem sempre crianças. Crescem e por vezes são totalmente contrários à educação que lhes foi dada, se voltando contra os pais e culpando-os por tudo que lhes acontece de mal e por quem são.

As pessoas têm filhos também por motivos egoístas. Querem “deixar sua semente”, se perpetuar através de um ser que carrega seu sangue e seus genes, que continuará o nome da família. Para mim, plantar uma árvore e escrever um livro já bastam. Além disso, é comum os pais passarem suas frustrações e sonhos para os filhos, querendo que sejam como gostariam de ter sido. Querem alguém para cuidar delas na velhice, porém quantos idosos, muitas vezes são abandonados e desrespeitados por seus filhos. Querem alguém para amar e que lhes ame, algo que nem sempre acontece. Querem, muitas vezes, exercer poder sobre alguém. Tudo isso é vaidade das vaidades.

Mas filho não é fruto do amor de um casal? Talvez. Mas esse amor é destruído quando os filhos nascem. A atenção e amor da mulher pelo marido são transferidos para o filho. E o marido passa a enxergar a esposa como mãe, não como mulher. Os apelidos carinhosos dão lugar a “pai” e “mãe”, apagando toda paixão e atração que existir. O casal perde a liberdade e a espontaneidade, pois não pode mais fazer o que quer quando bem entender.

Mas ter filhos não é o processo natural? Não devemos povoar a terra? Está na Bíblia, dizem. Mas há quanto tempo levamos vidas artificiais em todos os aspectos? Mudamos o curso de tudo. E a terra já está com superpopulação, não precisamos nos preocupar. Ademais, é natural tantas crianças abandonadas, maltratadas, vítimas de todo tipo de violência por pais que não deveriam ter tido filhos?

O curso da vida de alguém muda com seus rebentos. Muitas vezes abandona carreira, planos e sonhos para se dedicar a prole. Muitos regulam seu próprio consumo para que os filhos tenham o que desejam. E quase sempre cobram isso depois, querendo que os filhos sejam aquilo que projetaram.

Sempre que minha namorada se esquece de meus argumentos e, como a maioria das mulheres, volta ao desejo de ter filhos, esquecendo-se de outros, sempre faço a mesma pergunta, você quer ter um filho ou conhecer Paris?

14 COISAS QUE ODEIO EM SOCIOLOGIA E UMA QUE ADORO (QUE TALVEZ VALHA PELAS 14)

Primeiro peço a benção em nome de Marx, Durkheim e Weber (a Santíssima Trindade ou Os Três Porquinhos?) porque adoro sociologia. Talvez não dê pra ficar rico, mas me aponte outra profissão universitária que se consiga essa proeza sem empreendedorismo ou corrupção! Mas, afinal, não é pelo dinheiro, todos precisamos de sociologia. (Será?). E todos os outros cursos bebem da gente, então, cadê o respeito? Bom, mas vim pra odiar; cá entre nós sociólogos e futuros sociólogos.

Odeio em sociologia o fato de sociólogo odiar sociólogo. Tivemos até presidente sociólogo, mas o odiávamos. E ele nos odiava, ao que parece, ao vetar o projeto de lei (PL n° 09/00) que tornaria obrigatório o ensino de sociologia (e filosofia) no Ensino Médio, embora houvesse sido aprovado na Câmara Federal e no Senado. (Atualmente já é obrigatório, Lei sancionada pelo Presidente Lula, que diz que ler dá azia e não tem curso superior)

Odeio em sociologia não estarmos mais na dianteira das pesquisas e descobertas, perdemos espaço para a psicologia, psicologia evolutiva e para a neurociência (que tem usado em muito, e muitas vezes refutado, as teorias sociológicas).

Odeio em sociologia o fato de que ninguém paga a sociologia. Por trás de outros cursos como os de saúde e tecnologia tem-se indústrias investidoras. E para nós?

Odeio em sociologia o fato de que todos os cursos têm seus ícones, mas, céus! Marx é passado!

Odeio em sociologia essa crise de identidade. Qual é mesmo nosso objeto? A sociologia é mesmo uma p#*@ safada que se envolve com tudo?

Odeio em sociologia estarmos alegres e esperançosos com a possibilidade de sermos professores do Ensino Médio (Já é obrigatório, mas com restrições e indefinições). Isso é redutor da profissão. E a área técnica e a de pesquisa?

Odeio em sociologia essa nossa atitude anticapitalista constante. Tem gente (do meio acadêmico e fora dele) que confunde sociologia com socialismo.

Odeio em sociologia nossa desunião de classe, falta de corporativismo (isso não é pecado social!). Não temos nem conselhos. Alguns dos nossos poucos sindicatos sobrevivem pela fé (!).

Odeio em sociologia essas neuras e mania de perseguição por ser um curso sem status (curiosamente essa palavra é da sociologia, segundo o Aurélio e o Michaelis) atualmente. Sabiam que existe economia doméstica e engenharia de pesca?

Odeio em sociologia as conversas que só giram em torno de economia e política. Alguém aí já ouviu falar de cinema, de literatura, de sexo?

Odeio em sociologia esse messianismo dos alunos do curso. Achamos que somos os superiores, os detentores da salvação da humanidade. Será que poderíamos ser um pouco mais técnicos e menos utópicos? Fazer análise social e não teologia?

Odeio em sociologia o fato de não querermos trabalhar em empresas privadas. Não somos operários esclarecidos?

Odeio em sociologia que todo mundo se mete a fazer análise sociológica. Todos querem fazer mestrado e doutorado em sociologia, mas ninguém quer fazer bacharelado.

Odeio em sociologia o fato de ter caído no domínio público como a filosofia. Todo mundo usa e ninguém paga. Ou vendemos nossas análises muito barato.


Contudo, tem uma coisa que adoro. Nossa formação ampla. O especialista que entendia tudo de olho esquerdo, mas nada do direito está desempregado. Voltamos à análise da totalidade. E só o curso de sociologia prepara profissionais de visão ampla. Temos de tudo, opinamos (e às vezes fazemos ciência) sobre tudo, vemos um pouco de tudo. Por isso nossa diversidade. Temos plays, junkies, alternativos, mainstrems, niilistas, religiosos, céticos, ateus, nerds, geeks, hipsters, de esquerda (principalmente!) e de direita. Temos até alguns anarquistas. E convivemos bem. Temos de tudo pra ser a profissão mais prestigiada na nova era em que vivemos -ou na atual conjuntura, se preferir.

Saudações em nome de Florestan Fernandes, o apóstolo Paulo da sociologia.

PROMESSA

Olhei pra você mais uma vez, finalmente; mas não pude fixar o olhar. Vergonha de ter dado ao tempo momentos que poderiam ter sido nossos. Minha memória amorosa manteve você igual, mesmo com tantos anos que nos separaram dolorosamente. Você continua linda. Assim deitada parece sonhar com a história de amor que nos foi negada. Esperei por esse dia como se fosse o mais significativo de minha existência, onde nem imaturidade nem outros nos impedissem de ousar amar loucamente, de gritar e correr e não mais conter o impulso que me fazia diferente, e extraía o melhor de mim, com sua presença. Desejei, agora adultos, reviver os anos de paixão de adolescentes. E sinto, agora, imóvel perante você, que minha vida finalmente fez sentido, pois te reencontrei. Só te peço perdão por ter chegado tarde e você não mais poder ler no meu olhar o quanto te amo, mesmo que Tempo e Espaço e Destino tenham nos negado a autoria do nosso amor. Morro agora com você, cumprindo nossa antiga promessa de ou os dois vivem ou os dois morrem.

O SONHO DE SER FUNCIONÁRIO PÚBLICO

Ser funcionário público. Eis o sonho de milhares de brasileiros atualmente. E quase invariavelmente, o sonho dos fracassados. Daqueles que não se julgam suficientemente competentes para as empresas privadas, muito mais exigentes e seletivas. Dos que não querem continuar estudando e se superando a cada dia.

Estabilidade. A palavra mais citada por aqueles que querem passar num concurso público e que sustentam centenas de jornais, sites e cursos especializados. É verdade, num país como o Brasil, de renda per capita tão baixa e flutuante, é normal querer ter estabilidade. Mas, no fundo, o que querem é comodidade. Emprego garantido, independentemente da produção ou aprovação do cliente. Nada de estudar mais, de trabalhar mais, afinal, todos sabem, no setor público é fácil não trabalhar.

Não precisa saber inglês, nunca ouviram falar em marketing, não precisa ter conhecimento de mundo, não precisa tratar bem o cliente. Na verdade, muitos nem tem inteligência e controle emocional para trabalhar, sequer para passar numa entrevista em uma empresa privada, inexistente no setor público, basta passar numa prova de múltipla escolha.

Que me perdoem os muitos funcionários públicos competentes e que trabalham muito, sei que existem, conheço alguns. A questão é que muitos dos que querem entrar no funcionalismo público hoje são aqueles que nunca conseguiriam chegar a lugar algum no setor privado. Seu desejo é trabalhar pouco, ganhar muito e se aposentar com todas as regalias possíveis. É a cultura do malandro. Detestamos trabalhar, mas queremos ficar ricos.

Os que sonham em ser funcionários públicos precisam aprender algo com os que estão dando tudo de si para ascenderem no setor privado. Competência, constante aprendizado, maximização de resultados e foco no cliente.

Publicado originalmente no jornal O Povo de 10 de novembro de 2007

OS CANGACEIROS E OS TRAFICANTES

Não há uma explicação única para o fenômeno nordestino do final do séc. XIX e início do séc. XX, conhecido como cangaço. Mandonismo dos coronéis e a servidão nas fazendas, miséria, desamparo e menosprezo da Igreja estão entre as mais citadas. Os estudiosos apontam uma pluralidade de causas. Ao observar essas causas e, naturalmente, suas conseqüências, vemos inúmeras semelhanças com um fenômeno mais próximo de nós, o tráfico de drogas.

O cangaceiro, ao contrário do mito, foi o bandido do sertão. O traficante, longe da celebridade midiática, é o novo bandido urbano. O cangaceiro foi o antigo jagunço, protetor do coronel e mantenedor da ordem. Rompeu com este para se tornar andarilho, mas as alianças continuaram. Muitos coronéis, políticos e religiosos poderosos viraram coiteiros, protetores dos bandos. Vários novos coronéis, políticos e religiosos protegem o traficante. Os dois primeiros com dinheiro, armas e cobertura penal; os últimos com os chamados direitos humanos do criminoso.

Cangaceiros tinham acesso a armas exclusivas das forças armadas. Isso lembra algo hoje? Policiais lhes vendiam armas, que compravam com o dinheiro dos saques e de aliados poderosos. Os de hoje, claro, não precisam roubar, vendem seu “produto” a milhares de pessoas iludidas com seus efeitos. Muitos policiais daquele período, que se alistavam nas volantes, fingiam perseguir os cangaceiros e por vezes praticavam crimes em seu nome. Alguns deles parecem ter sobrevivido até os nossos dias.

No cangaço não se matava gente de “posição”. Com raríssimas exceções é o que se vê hoje em dia.

Aqueles seguiam fora-da-lei, com um código de ética próprio, com punições para desobedientes e dissidentes. Praticavam seqüestros, assassinatos cruéis como degolamentos e desmembramentos. Mas, em contrapartida, alimentavam sua gente e distribuíam sobejo de saques aos pobres. Os de cá, vemos nos jornais, fazem isso todos os dias, mantendo muitos na favela com alimentos e remédios.

As mulheres amavam os cangaceiros e até faziam parte dos bandos, afinal eram livres aventureiros, ricos e perfumados. Os nossos, andam em carros de luxo, aparecem na TV e são celebrados em filmes e livros. Que garota sonhadora, aventureira e ambiciosa não os admiraria?

O povo, mesmo ultrajado, contava suas façanhas por vilas e cidades, tinha medo e admiração por aqueles homens vestidos com roupas de couro. Os de agora, metidos em roupas de marca, são admirados nas favelas e fora delas.

Eles produziram sua estrela mais brilhante: Lampião. Nós a nossa: Fernandinho Beira-Mar.

Há muito que o mito do cangaceiro revolucionário social foi desmentido. Agora é necessário eliminar a idéia de que o traficante está enfrentando o sistema e é o herói que irá subvertê-lo e transformá-lo.

Publicado originalmente no jornal O Povo (1ª vez em 25 de março de 2007 e 2ª vez em 1º de junho de 2007) 

WEEKEND



JUVENTUDE ETERNA

Alcançamos, finalmente, a tão sonhada juventude eterna. Ou quase. Sonho perseguido desde a pedra filosofal da alquimia até o rock and roll, homens e mulheres sempre tentaram se preservar jovens, através das ervas e das artes. Talvez ter um retrato pintado de si mesmo, o qual absorvesse todos os sintomas da velhice, como o de Dorian Gray.

O Gênio da Lâmpada parece querer atender esse desejo. O avanço das ciências médicas e das ciências sociais conseguiu o que alquimistas e astros do rock tanto tentaram. Temos tratamentos sofisticados para os mais diversos males, curas para quase todas as enfermidades, cirurgias plásticas que disfarçam a ação do tempo, cosméticos que parecem milagrosos, melhores informações sobre os alimentos (que nos nutrem e nos matam ao mesmo tempo), freqüentamos academias e temos uma infinidade de remédios, até mesmo o Viagra, nada mais suficiente para se sentir jovem.

E temos conhecimento social acumulado para entendermos melhor a sociedade e o indivíduo e diminuirmos os preconceitos, vivermos em harmonia com as diferenças, aceitar que existem diversas maneiras de se viver. Aos poucos quebramos tabus sociais. Durkheim diria que é mais fácil hoje do que em sua época se sobressair ao estabelecido, não ser tão coagido a seguir o grupo. Ou que ser coagido socialmente hoje é viver como se quer, incentivado por frases do tipo "Seja você mesmo!" ou "Faça o que quiser!". Sintoma da chamada pós-modernidade. O self-service de crenças, valores e comportamentos.

Não é vergonha namorar pessoas bem mais jovens, mesmo para mulheres mais velhas que namoram rapazes. São personagens até de novelas. Nem é vergonha vestir-se como adolescentes, a moda tem seguido essa tendência. Ou freqüentar clubes da terceira idade (ou melhor idade, idoso é uma palavra maldita). Vemos idosos (desculpe-me!) com vidas renovadas no trabalho, nas ruas e nos bancos de universidades.

Cultuamos a juventude, isso é bom, somos humanos, temos medo do fim, queremos viver para sempre. E os jovens acreditam nisso.

Publicado originalmente no jornal O Povo de 02 de agosto de 2008

FRAÇÃO DE SEGUNDO

Para o meu dia fazer sentido
Primeiramente procuro teus olhos
Vivo nesse único segundo
Em mundos superiores
Construído pela imaginação dos iluminados
Seres ousados que mudam as histórias
Reescrevendo-as como desejam

Pegue os pincéis
Ouse
Pinte o que vê
Pinte o que deseja
Agora escreva
É conto?
É poesia?
Como é o mundo criado por você?

Venha até aqui
Segure minhas mãos
Deixe-me te decifrar
Realizar seus desejos
De universos paralelos
Onde as escolhas são sempre perfeitas
E suas cores e texturas
São sempre como queremos

É logo ali adiante
Está preparada para novas verdades?
As suas verdades escondidas?
Você tem o dom
Brilhe
Eis-me aqui
Abra a porta

OS INTELECTUAIS E O PODER

Não é novidade que intelectual odeia intelectual. Prova disso é a absoluta desunião e a eterna guerra de vaidades que travam entre si. E o intelectual de esquerda é uma espécie mais esquizóide ainda. Vindo da classe média, e, não raro, da elite econômica e cultural odeia sua condição e põe sua fé e esperança na classe trabalhadora, que, por sua vez, nunca inicia nada em favor de si mesma. Basta ver as revoluções sociais que tivemos, foram sempre comandadas da classe média para cima.

Odiava-se declaradamente Fernando Henrique Cardoso, presidente intelectual, e sonhava-se e lutava-se por Lula, operário, semi-analfabeto, que se ufana de nunca ter ido à universidade e sempre mostra seu desprezo por livros.

Por que os intelectuais, cujo reduto é a universidade e cujo instrumento preferencial de trabalho é o livro, apóia alguém assim? Veja no que deu. Éramos felizes e não sabíamos. Por que não se empenham na tomada do poder, já que, virtualmente têm respostas e opiniões sobre tudo, e se apegam, como a uma verdade sagrada, à utopia da revolução operária, que, em tese, destruiria sua própria classe? Marx e Engels lutavam contra si próprios.

A máxima do carnavalesco até folcloriza essa ridícula obsessão dos intelectuais, afinal, parafraseando-o, quem gosta de pobre é intelectual, que acredita em revolução popular, pobre gosta mesmo é de carnaval, futebol, novela e de sonhar em um dia ser classe média, não há para o pobre luta de classes.

Sei que o papel do intelectual é a crítica, é agitar, provocar a reflexão, não lhe cabe a ação, mas não é hora de mudar isso? Não é o momento de os que pensam o mundo também agir sobre ele? Inaugurar um novo palco social, e, ao invés de esperar que alguém siga suas idéias, serem os próprios agentes? Marx deveria ter dito: Intelectuais do mundo todo, uni-vos!

MASTER SYSTEM

Hoje me despedi da infância. Quem me conhece até a idade pensará como, se ele tem quase trinta? À tarde comprei um Master System. Vi o anúncio ontem, no folder do Extra encartado no Diário do Nordeste, edição de domingo. Esqueci das notícias, do editorial, do horóscopo. Voltei à infância naquela foto do encarte chamando para o dia das crianças dali a duas semanas. O anúncio discreto brilhava para mim, talvez com alguma luz que estivesse vindo dos meus olhos, energia de idos anos. Fiquei excitado como uma criança quando quer algo, que não consegue nem dormir com a ansiedade da espera. Demorei ir para a cama. Também tinha anúncio do Mega Drive, da mesma geração e, claro, dos Playstation II e III, X Box e Wii. Mas o sabor há algum tempo perdido num trauma de infância estava no Master System.

Comecei a gostar de videogames um pouco mais para trás, no seu lançamento aqui no Brasil nos anos 1980. Atari e Odissey. Preferia o primeiro. Quase todos os meus amigos tinham um ou outro. Maioria Atari, creio. E eu jogava na casa deles e do meu primo que morava com meus irmãos mais velhos. Algumas horas minguadas, afinal eles tinham ciúme da novidade. E eu tanto queria um só meu, a família podia, mas era uma época ingênua quanto à tecnologia, faz pouco tempo, é verdade, mas era. Achava-se que o uso no console estragaria o aparelho de TV. Nessa época nem tinha controle, dizem que por causa do Roberto Marinho. Tinha-se de assistir a Globo. Preguiça levantar e trocar o canal. Um dia um amigo da escola até veio à minha casa com a caixa do seu Odissey debaixo do braço para jogarmos. Minha mãe não deixou, ia estragar a TV. Desculpei-me com meu amigo e fui para um lugar da casa chorar. Ela não sabe até hoje. Eu estava perdendo aquela novidade. Quem sabe hoje fosse um profissional da área. Seria o momento e a idade oportuna. Designer de Jogos é um profissional procurado e bem remunerado. Tem faculdade disso. Ganharia mais escrevendo pra jogos que pra jornais e revistas. Bem mais. É a indústria de entretenimento número um do mundo, ganha até de Hollywood. Fiquei sem videogame, frustrado, traumatizado e com as ciências humanas.

Cheguei perto de ter meu próprio console algumas vezes. O filho de uma família amiga da minha, mais velho que eu, me deu um Atari que fora dele. Quebrado. Nunca meus pais mandaram consertar. Esteve por muito tempo na minha caixa de brinquedos. Até fingi pra amigos que era meu desde novo, mas havia quebrado. A sogra do meu irmão sempre ia ao Paraguai comprar bugigangas para vender por aqui. Os importados e lojas de 1,99 não eram comuns. Minha mãe deu dinheiro pra que ela trouxesse um Atari pra mim. Esperei ansioso as semanas que passaram. Quando ela chegou e fui receber meu tão sonhado Atari, ela não havia trazido. Disse que não achou. Desculpa, claro. Fiquei com um carro a controle remoto. Hoje penso será que foi proposital, minha mãe não deu o dinheiro e me fez escolher um maldito carro? Às vezes acredito na teoria da conspiração.

Cresci um pouco. Chegou a nova geração de consoles. Nintendo, Mega Drive, Master System. E foi criado um novo negócio, a Locadora de Videogame. Brasileiro sempre acha um jeito de ganhar dinheiro. Eram tempos economicamente difíceis. Passei muitas horas em algumas delas, pude jogar sem ter de necessitar da caridade dos amigos. Contudo, o ambiente dessas locadoras não me agradava muito. Tinha os chatos que ficavam querendo ser os melhores e davam pitaco no jogo dos outros. A evolução continuou. Veio o Super Nintendo, Nintendo 64, joguei nos dois em locadoras. Nunca comprei nenhum. O trauma permanecia mesmo na adolescência. Acentuado pelo fato de não ser por não ter dinheiro, mas por causa de uma mentalidade familiar à qual nunca pertenci em nada. Sempre fui o deslocado, depressivo, nerd, caçula. Mais tarde veio o Playstation. Nessa época já tinha meu PC, jogava nele. Até mesmo jogos dos consoles antigos emulados. Meus sobrinhos já tinham o Playstation. E eu havia me afastado das locadoras, nunca me agradaram. E assuntos outros junto com a faculdade me levaram pra mais longe dos videogames. Mas jogava no computador até a madrugada, já morava sozinho, sobretudo Tomb Raider.

A distância aumentou quando chegou o Playstation 2 e o Xbox. Os jogos deram saltos qualitativos enormes, na narrativa e na imagem e na jogabilidade e interação. Fiquei de fora dessa revolução. Nem os jogos do celular me interessavam. Nas rodas de amigos nerds sempre falávamos de filmes, HQs, música, mas quando chegava o assunto dos títulos que estavam jogando eu me calava em meu trauma, em minha distância dos jogos.

Agora tem o Nintendo Wii e o Playstation 3. E eu não sei se ainda sei jogar. Não evolui com os consoles, parei alguns capítulos atrás na construção de sua história. Mas como adulto, quase independente, tendo caminhado através de uma mentalidade própria, diferente dos pais que acreditavam até nos problemas causados pelos videogames às TVs, tenho pesquisado sobre o Playstation 3. Vou comprá-lo. Junto, claro, com uma TV de LCD. O console necessita, deu um salto grande dessa vez. Usa Blue-ray e não mais cartucho, CD ou DVD. Não vou curar minha frustração com filhos, não pretendo tê-los. Meus irmãos que nunca foram nerds compraram videogames para os filhos. Eu não gostava muito de deixar meus sobrinhos jogarem no meu computador quando estavam em minha casa. Essa semi-dependência dos pais ainda que já seja um profissional formado, quem sabe, ainda tem a ver com esse fato marcante de minha infância. Por isso hoje comprei um Master System. Queria me curar desse trauma. Não poderia ter passado direto para o PS3. E não achei um Atari. As empresas têm colocado esses antigos consoles no mercado, para pegar o filão dos saudosistas. Não sou um deles. Sou alguém com um ponto mal resolvido de sua infância. Precisava comprá-lo. Espécie de cura. Poderia ter comprado um joystick e baixar na internet todas as roms de consoles antigos. Mas eu precisava deitar na cama, jogar como teria jogado na infância.

Assim que cheguei a minha casa o liguei na TV do meu quarto. Não ia ligá-lo na TV da sala, claro. Minha mãe ficou na porta olhando, perguntou depois de alguns minutos o que era. Rispidamente disse que era um videogame. Reação inconsciente. Ela saiu imediatamente. Fucei e joguei alguns minutos. Liguei pra namorada e contei da novidade e o porquê daquilo. Passarei algumas semanas jogando, mas já prometi dá-lo para os irmãos pequenos dela. Nem sei se vão gostar, pois já nasceram com o Playstation.

Nesse domingo do anúncio do jornal estava um pouco melancólico, depressivo melhor dizendo. Decisões adultas a tomar, trabalho, independência, mudanças. Talvez por isso veio o assunto, a vontade de comprar um objeto simbólico, meu rito de passagem tardio.
Vou jogar um pouco agora. O Inglês aprendido por influência da cultura pop americana, agora me ajuda a entender e interagir mais com as narrativas. Talvez falte o entusiasmo pueril. Creio que estou curado. Cicatrizarei em alguns dias de jogo. Estou pronto para a idade adulta. Para a independência. Para os problemas próprios dessa fase. Para as fases do PS3.

P.S.: Esse foi o texto mais caro que escrevi. Vou pagá-lo em 10x sem juros no cartão do Extra. E nem é um dos melhores que já escrevi. Fazer o quê.

Jogos Favoritos: River Raid, Enduro, Free Way, Pac Man, Super Mario Bros., Sonic, Alex Kid, Mônica no Castelo do Dragão, Tomb Raider, Heart of The Darkness. Testarei a partir de hoje os do Playstation II e III, Wii e XBox.

P.S.: Já comprei e testei por dois meses o PS2. Joguei GTA, sobretudo o San Andreas, Simpsons The Game, Tomb Raider Anniversary, Midnight Club. Vendi para um primo meu.



NO BRASIL, É ÓTIMO SER POBRE

É ótimo ser pobre no Brasil. Parece absurdo afirmar isso, mas os menos favorecidos dentro do nosso sistema econômico têm uma série de vantagens e benefícios que o Estado lhes proporciona.
A começar pela moradia. São vários os programas que dão casas para os que moram em áreas de risco, favelas ou que não podem pagar. O gasto com energia é mínimo, pois o consumidor de baixa renda conta com um subsídio que lhe dá um desconto considerável no valor de sua conta mensal. E, no campo, existem vários subsídios agrícolas para os pequenos agricultores.
Contam com um excelente programa gratuito de saúde. Através de hospitais e postos de saúde com atendimento clínico, exames, cirurgias – inclusive cirurgia plástica, tratamentos e remédios, tudo gratuitamente. Para quem mora distante há o programa Saúde da Família. Há também programa odontológico de graça. Uma pessoa de baixa renda não precisa comprar nem mesmo preservativos.
Outra coisa que têm de graça para si e para os filhos é educação, inclusive com direito a merenda e livros didáticos, podendo, inclusive, obter um diploma de nível superior numa universidade pública. Além disso, existem vários cursos profissionalizantes gratuitos para quem não pode pagar. Se quiser ter filhos e não tiver dinheiro o Estado fornece à mulher uma renda extra para que ela possa se sustentar no período da gestação e imediatamente depois. Some-se a isso os programas de transferência de renda como o Bolsa Família, Bolsa Escola, Fome Zero, Vale Gás e tantos outros. Mais tarde é possível se aposentar ganhando um salário mínimo sem nunca ter contribuído para a INSS.
Além de tudo isso ainda é possível ter lazer e atividades esportivas gratuitas. E através de ONGs e instituições de caridade é possível conseguir muitos outros benefícios. Junte-se a isso, por fim, os “bicos” nos cruzamentos.

Publicado originalmente no jornal O Povo, de 25 de agosto de 2007

MUNDOS INDEPENDENTES


DIREÇÃO


EM MEUS OLHOS

Não pude ainda ouvir a sua voz em frases inteiras em textos dirigidos só a mim, onde eu pudesse te responder e articular sons que traduzissem o que meus olhos já declamam quando encontram, brevemente, os seus. É a distância talvez que mais me põe perto de ti.
Não pude ver ainda todas as marcas do teu rosto. Vejo-te de longe e meus olhos, mesmo deslumbrados, não te captam por inteiro, seja com tua roupa de trabalho ou vestida de outros modos que me encantam mesmo sem você saber.
Sou presa, és livre, mas tenho que te considerar impossível, pois eu mesma o sou. Queria pelo menos ser tua amiga e ter mais ciúmes ainda quando te vir enamorada. Quem te abraçará e te levará ao altar? Certamente não poderá ser eu. Mas se por um instante nos tornássemos loucas e profundamente existencialistas e nos uníssemos, fôssemos cúmplices num arrebatamento de paixão e desvarios, me entregaria como Sonoko Kakiuchi[1]. Ao acordar, condenadas, não saberíamos se essa paixão louca fora sonho ou realidade, teríamos a lembrança prazerosa de um orgasmo de sentimentos. E de corpos.

[1] Personagem do escritor japonês Junichiro Tanizaki, que se apaixona, mesmo sendo casada, por uma colega de curso.

OLHOS MISTERIOSOS

Olhos misteriosos
A ti sorriu Cupido
Que me fez decifrá-los
No instante mágico
Em que flechou-me para ti

Protagonista de meus lugares imaginários
Onde me despedi da razão
E a existência fez sentido

Eis o novo mundo
Pequena Deusa
Universo paralelo dos diferentes
Bem-vinda a liberdade de realizar desejos
De viver o sonho
De criar histórias
Da ousadia de amar loucamente

Seja você, seja atrevida
Sinta o prazer do privilégio
De ser iluminada

Traduzirei seus anseios
Abrirei os caminhos
Foste chamada à vida
A incendiar-se no êxtase
Da paixão arrebatadora

Teu é o poder
Minha salvação e minha perdição
Sou só teu
Por que livremente preso a ti

MINI CONTO

De como um amor sublimado por muitos anos que tanto mal fez para os apaixonados finalmente foi agraciado com os favores dos deuses comovidos com as preces sinceras e insistentes para que finalmente chegasse o momento onde a vontade do Destino criasse um dia propício para mais uma celebração amorosa

se olharam como sempre faziam mas dessa vez o beijo há muito fantasiado foi real

PELE


CRISE DO TRABALHO

Diante dos elevados níveis de desemprego o Estado tem se tornado cada vez mais impotente, não lhe sendo possível assegurar uma política de pleno emprego, já que não pode interferir de maneira eficaz na racionalidade da economia de mercado, uma vez que o trabalho não é mais considerado, pelos novos nomes da razão econômica, o centro do processo produtivo. O Estado só pode interferir de maneira paliativa, investindo mais em políticas de proteção ao desempregado que em políticas de geração de emprego. É o que tem ocorrido tanto nas chamadas economias centrais como no Brasil.
Essa incapacidade do Estado em promover o pleno emprego, está aliada a constante crise econômica, que vem revelando que o capitalismo atingiu o ápice de sua expansão, notado pela falta de crescimento expressivo, pouco investimento em criação ou expansão de novas empresas e sim fusão de grandes corporações e produção de bens cada vez menos duráveis para acelerar o consumo.
O Estado social não pode interferir diretamente no sistema econômico, qualquer medida deve estar dentro desse sistema, o que dificulta seriamente um programa que gere emprego e renda, somando-se a isso os novos processos de trabalho, influenciados tanto pelas novas tecnologias como pelo novo modelo de funcionário polivalente, que realiza o trabalho de várias funções, obviamente ganhando por uma só. Além disso, o Estado não pode garantir o trabalho como um direito civil sem onerar a própria classe trabalhadora através dos impostos para cobrir as despesas de seguro-desemprego, previdência e indenizações. E isto se torna mais grave pelo alto índice de trabalhadores informais.
Nessa crise onde o mais importante é manter as empresas e, naturalmente, o lucro, falta espaço para manter as conquistas históricas da classe trabalhadora e para avançar em novas.

Publicado orinalmente no jornal O Povo de 30 de abril de 2007

ILLIANA

Illiana - era assim que chamava a si mesma - não agüentava mais a sua existência. Presa, numa caixa de ouro, no fundo do rio Tebas. Tomara consciência de sua existência já há muitas gerações. Era o feto abortado de uma deusa, que, estranhamente, não nascera, e mais ainda, permanecera vivo. Sua consciência ultrapassou o cárcere do corpo. Nas sombras e solidão das geladas águas sonhava com o mundo exterior que jamais iria conhecer, apenas intuía, com seus poderes semi-recebidos, a beleza da Terra e do Olimpo, morada de sua mãe que ousou amar um mortal odiado pelos deuses.

EU

Gosto de sonhar
Acordar no meio da noite
Lembrar-me em mundos estranhos
Talvez mundos paralelos
Onde sou outros (e outras)
Gosto de ser eu
E esta vida (dita real)
A qual penso ser a matriz
É responsável por isso
Mas outros eus pensarão a mesma coisa?
Os sonhos me fazem outros (e outras)
Como este que agora me acorda
Dirão vidas anteriores
Reminiscências
Prefiro achar que vivo vários eus
(Ao mesmo instante)
Sonho de ator

Voltarei a dormir
Quero saber mais de mim

COMEÇO DE LONGAS DATAS