PERIFERIA DO REINO


Para sua família foi um dia normal, com exceção dos contratempos de ter de providenciar os ritos fúnebres e a paga das despesas que eles provocam. Ninguém entre seus entes próximos diria que ele era o mais querido ou o mais engraçado. Nem entre os mais distantes. Sequer entre os poucos amigos.

Os sinos da pequena igreja do interior onde nascera replicavam o anúncio de mais um morto. As grandes portas da entrada não eram, sozinhas, suficientemente convidativas, pois ali era velado, pelos poucos que lá se encontravam por se sentirem na obrigação, alguém absolutamente comum. E ninguém gosta dos comuns, são espelhos.

Um dia lhe disseram que os lugares de morada no céu dependiam do número de pessoas em seu velório. Se muita gente, uma morada nobre, se poucas, na periferia do reino. Ele nunca acreditou.

Publicado originalmente no zine Os Putos e as Donzelas # 07 (Jan/Fev de 2006) do grupo literário Luminários.